Eles desistiram da estabilidade do emprego público para abrir uma empresa
Quem largaria um cargo no serviço público, abrindo mão da estabilidade na carreira profissional, para ser dono de seu próprio negócio? Pois foi isso que fizeram Francis Ferlin, Natália Ribeiro, Lucas Oliveira e Amanda Malucelli, que, após terem atuado algum tempo no funcionalismo público, decidiram pedir exoneração do cargo e empreender.
Para Paulo Crepaldi, analista de negócios do Sebrae-SP, empreender pode ser tão incerto quando prestar uma prova de concurso, se você não se preparar bastante para isso. "Em ambos os casos, você precisa estudar muito, ser determinado e se dedicar ao máximo para ter sucesso", declarou ele, que dá outras dicas (veja no final deste texto).
O UOL ouviu quatro ex-servidores públicos que largaram o tão almejado cargo no governo para empreender.
12 anos na Polícia Militar de SC
Por incentivo dos pais, que eram servidores públicos, Francis Ferlin, 38, começou a estudar para concursos quando estava na faculdade de direito em Chapecó (SC). Foi aprovado em 2006 na Polícia Militar de Santa Catarina.
"Meus pais acreditavam que o sucesso profissional e a estabilidade financeira passavam obrigatoriamente por um trabalho no setor público", declarou Ferlin.
Dez anos depois, e com salário de R$ 4.800 como cabo da PM, Ferlin decidiu investir R$ 50 mil num negócio próprio: comprou uma pequena loja de artigos para celular em um supermercado de Chapecó.
"Eu e minha mulher [a médica veterinária Monique Morselli] decidimos usar o dinheiro que havíamos guardado para a quitação do nosso apartamento, para comprar esta loja", disse Ferlin. Os dois tocavam o negócio —rebatizado de ItCase— em paralelo às suas profissões.
Em 2018, após a abertura da terceira unidade da rede na cidade, Francis decidiu se dedicar integralmente à expansão do negócio e deixou a Polícia Militar, depois de 12 anos de profissão.
A ItCase vende acessórios para celular, como capinhas, películas, carregadores e fones de ouvido, entre outros. A rede tem nove lojas. No ano passado, o faturamento foi de R$ 2 milhões. O lucro não foi revelado. A franquia da rede tem investimento inicial de R$ 90 mil.
9 meses num posto de saúde no interior do PR
Durante nove meses em 2013, a fisioterapeuta Natália Ribeiro, 32, trabalhou num posto de saúde em Bandeirantes (PR). Ela era concursada da prefeitura e ganhava R$ 712 de salário.
"Mas não estava satisfeita, pois eu era só mais uma em um posto de saúde. Não conseguia fazer a diferença", afirma ela, que decidiu abrir mão do cargo público para "ir em busca de realização profissional", como Natália mesma diz.
Em 2014, ela foi trabalhar em uma franquia de estética em Avaré (SP), enquanto fazia cursos nessa área. Na cidade, conheceu Caio Oliveira, hoje seu noivo e sócio. Em 2016, Oliveira, que trabalhava no banco Mercantil, foi transferido para Cruzeiro (SP), e Natália foi junto.
Em Cruzeiro, ela abriu a Mais Top Estética, com investimento de R$ 40 mil. Um ano depois, Oliveira pediu demissão do banco e virou sócio de Natália.
Hoje, a rede de serviços de emagrecimento, beleza e bem-estar tem 145 unidades, sendo seis próprias. São quatro modelos de negócio, com investimento inicial que varia de R$ 74 mil a R$ 290 mil.
Em 2020, a empresa faturou R$ 12 milhões. O lucro não foi divulgado.
Quase 3 anos trabalhando no Detran
Depois de dois anos e oito meses trabalhando no Detran (Departamento Estadual de Trânsito) em Tatuí (SP), Lucas Oliveira, 30, pediu exoneração do cargo para montar uma empresa que, entre outros serviços, recorre de multas de trânsito e cassação de carteira de habilitação: a Mister Multas.
"Prestei concurso público por grande influência de minha família. A gente acreditava que o concurso era o melhor caminho para conquistar uma maior estabilidade profissional e um bom salário", declarou Oliveira, que no Detran ganhava R$ 5.200 por mês. Ele começou na função de agente estadual do trânsito (atuava no julgamento de processo e suspensão de CNH) e chegou a diretor do Detran na cidade.
Embora tivesse estabilidade profissional, Oliveira diz que se sentia frustrado, por não conseguir "fazer a diferença", apesar de "cheio de ideias na bagagem e com muita vontade de trabalhar", ao ingressar no Detran, em 2014.
Criada em 2017, em Tatuí, a Mister Multas é uma rede especializada em recursos de trânsito com foco em condutores que precisam de suporte técnico e jurídico para resolver problemas com a carteira de habilitação.
"Temos uma equipe que elabora as defesas junto aos órgãos de trânsito, para recorrer de multas, cassação de carteira, suspensão do direito de dirigir etc.", disse Oliveira, que investiu R$ 1.200 no negócio.
A rede tem 42 franquias. O investimento inicial varia de R$ 14,9 mil a R$ 34,9 mil. Em 2020, a franqueadora faturou R$ 1,5 milhão, sendo 40% de lucro.
4 anos na Justiça do Paraná
Formada em advocacia pela PUC do Paraná, Amanda Malucelli, 34, trabalhou durante quatro anos na Justiça do estado, após prestar concurso público. Seu salário era de R$ 5.000 na época.
Algum tempo depois, foi para o Ministério Público, em Marilândia do Sul (PR). Ainda atuando como oficial de promotoria, em 2016, Amanda decidiu, junto com o marido, Fernando Malucelli, vender o apartamento e abrir uma franquia da OrthoDontic, em Curitiba. O investimento inicial foi de R$ 700 mil.
"Escolhemos essa franquia por influência do meu sogro, que já era sócio de uma das clínicas em São Paulo. Neste início, eu segurava as finanças, enquanto o marido dava os primeiros passos na clínica", afirmou Amanda, que ficava em Marilândia do Sul durante a semana e voltava a Curitiba na sexta à noite.
"Além de todo o estresse de estar longe do Fernando, a clínica começou a crescer com muita rapidez. Na impossibilidade da transferência de cargo, decidi ir para Curitiba para ficar ao lado dele", disse.
Em 2017, ela pediu exoneração do cargo em Marilândia do Sul e entrou para gerenciar o lado administrativo-financeiro da clínica.
Hoje, o casal tem duas franquias da OrthoDontic e faturou R$ 4 milhões no ano passado. O lucro não foi revelado.
A rede OrthoDontic foi criada em 2002, em Londrina (PR). Tem 273 unidades. O investimento inicial é a partir de R$ 500 mil.
Autonomia de tempo e dinheiro deve ser considerada
Paulo Crepaldi, analista de negócios do Sebrae-SP, disse que, antes de pedir exoneração de seu cargo público e empreender, o servidor deve, primeiro, entender qual a afinidade com o segmento em que pretende atuar, além de estudar e conhecer muito bem esse mercado (público-alvo, fornecedores, concorrentes).
"Em paralelo a isso, o empreendedor deve desenvolver um plano de negócio, determinando investimento inicial, custos fixos e variáveis, estratégias para atingir o público-alvo, assim como definir indicadores como lucratividade e ponto de equilíbrio. Inicialmente, faça testes do seu produto ou serviço, visando identificar a aceitação", afirmou.
O analista disse, no entanto, que a questão da autonomia de tempo e dinheiro deve ser levada em consideração.
"Quem abre mão da estabilidade do serviço público achando que vai trabalhar menos e ganhar mais, está enganado. Pelo menos no início, com a estrutura do negócio ainda enxuta, geralmente é você que faz tudo na parte estratégica, gerencial e operacional da empresa. Fora saber lidar com fatores externos como instabilidade econômica, sem nenhuma garantia efetiva de um salário caindo na conta todo mês", afirmou.
Segundo ele, o planejamento é essencial para diminuir as incertezas e consequentemente, aumentar as chances de sucesso.
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