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Bolsa vai 'dedurar' investidores para Receita; risco de malha fina aumenta?

Mitchel Diniz

Colaboração para o UOL, em São Paulo

23/07/2021 16h31

O Leão não quer mais esperar a declaração do Imposto de Renda para saber onde você investe o seu dinheiro. Corretoras e outras instituições de mercado, como a própria Bolsa, serão obrigadas a transmitir diariamente os dados das operações de seus clientes pessoa física, como investimento em ações, fundos, BDRs e ouro à Receita Federal.

A regra já deveria ter entrado em vigor, no começo de julho, mas está suspensa temporariamente, pois precisaria de autorização prévia dos contribuintes. O controle mais rigoroso do Fisco ajudaria no combate à sonegação de impostos sobre ganhos de capital. Especialistas ouvidos pelo UOL acreditam que a medida vai fazer com que muito investidor caia na malha fina ou se recuse a compartilhar as informações. Veja abaixo.

Um novo dedo-duro?

Hoje as informações sobre investimentos em renda variável chegam ao conhecimento da Receita de duas formas: pela declaração anual do IR ou no momento da cobrança do imposto conhecido como "dedo-duro", que incide sobre o lucro de operações com ações.

Esse imposto é de 1% quando o investidor lucra com a venda de uma ação que comprou no mesmo dia (day trade) e de 0,005%, em operações de maior prazo com lucro acima de R$ 20 mil. É a cobrança desse tributo, retido na fonte, que faz com que a Receita saiba que o investidor está aplicando na Bolsa, além do tamanho da operação.

"Se o investidor não pagar o imposto devido com o lucro da operação, a Receita vai ficar sabendo, porque o 'dedo-duro' recolheu parte do tributo", afirma Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo Investimentos.

Ele acredita que a prestação de contas diária ao Fisco funcionaria de maneira parecida, independentemente da operação ou de retenção de imposto na fonte.

"Tem o desconforto da vigilância diária, mas é uma via de segurança para o mercado financeiro", diz Franchini.

Mais gente na malha fina

Para o advogado tributarista João Victor Guedes, sócio do L.O. Baptista Advogados, a nova regra deve ajudar a encontrar inconsistências nas declarações de Imposto de Renda e muitos contribuintes pessoa física devem cair na "malha fina".

"Na prática, a maioria dos investidores pessoa física passa por isso porque não declara os ganhos adequadamente. Não é porque não querem, é por ser complexo mesmo", afirma o advogado.

Segundo Guedes, o pequeno investidor tem dificuldades em fazer o controle de tributos sobre ganhos e perdas com operações na renda variável. "São controles de preços e de custo que o contribuinte precisa fazer de forma manual", diz o tributarista.

Um gestor de recursos ouvido pelo UOL e que pediu para não ser identificado diz que é por esse motivo que muitos investidores procuram aplicar em fundos.

"Não sei se o envio diário de informações à Receita chega a incomodar, mas conheço muita gente que prefere investir em Bolsa via fundo de ações para fugir das complicações do IR. Eu inclusive", disse ele.

Resistência dos contribuintes?

A instrução normativa que prevê o controle mais amplo da Receita sobre os investimentos foi publicada em 1º de julho no Diário Oficial da União. Mas só não entrou em vigor porque a própria regra está condicionada a uma autorização prévia do contribuinte.

As informações dos contribuintes seriam transmitidas pelas corretoras a B3, depositária central do mercado, que repassaria os dados à Receita. O Fisco ainda vai detalhar como será feito esse trâmite e a partir de quando a regra entraria de fato em vigor.

A Receita Federal disse ao UOL que, inicialmente, os clientes das corretoras podem autorizar o repasse das informações diretamente pela área logada do site da B3. A data para que instituições comecem a transmitir os dados dos contribuintes ao Fisco ainda está sendo negociada e depende da publicação de um "Ato Declaratório". Segundo a instituição, esse ato ainda não tem data para sair.

Outra questão que ainda precisa ser elucidada é sobre o que pode acontecer com o investidor que não quiser que sua posição financeira seja compartilhada com a Receita.

"Ele poderia ficar impedido de investir, da mesma forma que acontece com o cliente de uma corretora que não preenche o formulário sobre perfil do investidor, requisito da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). O sistema não permite que ele opere", diz João Victor Guedes, do L.O. Baptista Advogados.

O tributarista acredita que se a Receita não esclarecer esse ponto, as instituições de mercado podem exigir que os clientes autorizem o envio de dados para não pagar multas. Segundo a norma do Fisco, as empresas que não transmitirem as informações podem sofrer multa entre R$ 500 e R$ 1.500 por cliente que não compartilhar posição financeira.

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