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Mentoria nas empresas aproxima gerações e desenvolve novas lideranças

Empresas têm aderido a programas de mentoria, em que profissionais experientes aconselham funcionários mais novos na condução da carreira - krakenimages/Unsplash
Empresas têm aderido a programas de mentoria, em que profissionais experientes aconselham funcionários mais novos na condução da carreira Imagem: krakenimages/Unsplash

Julia Moióli

Do UOL, em São Paulo

14/07/2021 04h00

Um líder sênior que abriu seu plano de desenvolvimento individual para ouvir a opinião de um jovem funcionário sobre o futuro. Um deficiente auditivo que viu em um colega tetraplégico uma dificuldade talvez maior que a sua própria. Um colaborador que queria entender os porquês das metas, incomodando o chefe mais tradicional.

Em comum, as situações acima, citadas por entrevistados para essa reportagem, aconteceram ou foram abordadas em mentorias, ou seja, durante processos em que profissionais experientes (ou com especialização em determinado assunto) constroem um relacionamento de confiança com outros funcionários para auxiliá-los em dúvidas, transições ou crises, com foco no longo prazo. "O programa de mentoria é importante para aproveitar o conhecimento de quem tem mais experiência", diz Lina Nakata, professora da FIA Business School. "O mentor já passou pelo caminho das pedras e tem conhecimentos implícitos que o mentorado não iria adquirir por meios formais."

Além de orientar futuras lideranças na progressão de suas carreiras, a ferramenta tem sido usada por grandes empresas para lidar com questões geracionais e relativas à diversidade. Para cumprir todos estes objetivos, programas de mentoria precisam ser bem estruturados. "É importante que haja afinidade entre mentor e mentorado para que as conversas se tornem naturais e produtivas", destaca Renato Grinberg, especialista em treinamentos profissionais e autor do livro Atitudes Extraordinárias (Editora Gente). De acordo com ele, é fundamental, que os mentores sejam selecionados e treinados cuidadosamente - e que mantenham a confidencialidade das conversas. "O mentor pode, por exemplo, convidar o mentorado a refletir sobre sua carreira e atividades fazendo perguntas como 'quais são as situações em que ele mais teve sucesso ou insucesso e porquê?'. A partir das respostas do mentorado, o mentor pode orientá-lo em aspectos mais específicos", explica Grinberg.

De acordo com a pesquisa FEEx - FIA Employee Experience (edição 2020), dentre os 100 Lugares Incríveis para Trabalhar, 55% das empresas oferecem mentoria. Uma delas é o Bradesco, que aposta no desenvolvimento de talentos internos. "É uma ferramenta poderosa", diz Juliano Ribeiro Marcilio, diretor de recursos humanos. "Os dois lados passam por um processo de capacitação que reforça conceitos e habilidades e têm a oportunidade de conhecer novas realidades e perspectivas, já que não costumam fazer parte de uma mesma área." Segundo ele, muitas relações continuam para além do programa.

É o que também observa Agapito Troina, sócio do grupo de transformação de negócios Visagio, que já foi até padrinho de casamento de mentorados. O programa começa assim que o profissional entra na empresa. O mentor é um sócio com características pessoais, profissionais e interesses em comum com o mentorado. Troina mentora 30 colegas e diz que, no final das contas, é o maior mentorado da Visagio. "Eu tenho 150 conversas por semestre e aprendo muito mais sobre a empresa." Para ele, uma relação de confiança entre os dois lados tem relação direta com o desempenho do funcionário e o crescimento dele na carreira.

Niva Ribeiro, vice-presidente de pessoas da Vivo - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Para Niva Ribeiro, vice-presidente de pessoas da Vivo "a mentoria encoraja a troca de conhecimento e de habilidades entre os colaboradores, aumenta a satisfação, constrói redes internas e retém talentos."
Imagem: Acervo pessoal

O sucesso dessa combinação é tão importante que, na Vivo, os mentorados têm a oportunidade de apontar mentores de sua preferência para um ciclo de seis meses. "O mentoring encoraja a troca de conhecimento e de habilidades entre os colaboradores, aumenta a satisfação, constrói redes internas, retém talentos e incentiva as pessoas a ser agentes de mudança e impulsionar a transformação digital na empresa", diz Niva Ribeiro, vice-presidente de pessoas da Vivo. Segundo ela, quanto melhor a experiência dos colaboradores, melhor será a experiência dos clientes.

Multinacionais podem oferecer um atrativo extra: a conexão com mentores de outras partes do mundo. Na empresa de tecnologia médica Medtronic, todos os funcionários podem utilizar uma plataforma self-service para buscar mentores internacionais. O mesmo ocorre na Basf América do Sul e na farmacêutica Sanofi.

Na empresa química, a plataforma digital MentForMe permite a criação de perfis e sugestão de mentores compatíveis. "Com base nas experiências e histórias pessoais, mentor e mentorado definirão juntos objetivos e temas que serão trabalhados", diz Bruno Ferrante, gerente sênior de desenvolvimento de talentos e experiência do colaborador da BASF América do Sul.

Na farmacêutica, o timing é valorizado. "A mentoria acontece no momento em que o colaborador precisa. Se acabou de ser promovido ou mudou de cargo e precisa saber mais sobre aquela função, ele pode descobrir um mentor que vai ajudar naquela necessidade específica, no momento em que ele precisa", conta Pedro Pittella, diretor de recursos humanos da Sanofi no Brasil.

Mentoria personalizada

Programas de mentoria também preparam talentos de públicos específicos para assumir novos desafios. Na Pepsico, o foco são profissionais negros. Os mentorados ganham apoio para a tomada de decisões, um plano de desenvolvimento e ampliação de habilidades e conhecimentos. No ciclo de 2019, 35% dos participantes conquistaram novas posições dentro da empresa após a mentoria. "Essa ação vai ao encontro direto da nossa meta de ter, no Brasil, ao menos 30% de pessoas negras em cargos de liderança até 2025", diz Carlos Domingues, gerente de cultura, EVP (Employee Value Proposition) e diversidade e inclusão da Pepsico no Brasil.

O mesmo acontece na Bayer que decidiu acelerar o desenvolvimento de seus colaboradores negros. "O programa aborda questões como o medo de errar e a dificuldade de traçar um plano de desenvolvimento", conta Fábio Abadio, analista de crédito e cobrança sênior da Bayer e co-líder do grupo BayAfro. Ao final do período do programa, há um encerramento com troca de opiniões entre mentores e mentorados - sempre mantendo a confidencialidade das conversas individuais anteriores.

A Unilever usa a mentoria para investir na capacitação de líderes mulheres. O principal objetivo é dar suporte ao desenvolvimento de habilidades, por meio da expansão de networking, das trocas de experiência e das provocações para buscar novos conhecimentos", diz Luana Suzina, gerente de diversidade e inclusão.

A Kimberly-Clark oferece o Women Mentoring Women. O programa faz parte da iniciativa She Can, que inclui mentoria, autoavaliações, discussões em grupo e workshops sobre empoderamento feminino e já atendeu mais de 350 funcionárias na América Latina. "Acreditamos que ter diversidade no nosso quadro de colaboradores e em posições de tomada de decisão é um dos pontos chave para nos aproximarmos cada vez mais do consumidor", diz Natalia Taglieri, gerente de gestão de talentos.

Mentoria reversa - Amy Hirschi/Unsplash - Amy Hirschi/Unsplash
Em algumas empresas, executivos sêniores são mentorados por jovens profissionais a fim de melhorar a comunicação e o trabalho em conjunto entre diferentes gerações.
Imagem: Amy Hirschi/Unsplash

Troca de papéis

Às vezes, os líderes executivos assumem o papel de mentorados quando se trata de questões como a diversidade. É a chamada mentoria reversa. Na IBM Brasil, membros da comunidade LGBT, homens e mulheres negras e pessoas com deficiência contam com um programa para contar sobre suas vivências pessoais e profissionais, o que amplia sua representatividade. "Embora o executivo tenha mais experiência no negócio, quem tem lugar de fala sobre certos temas são os funcionários", diz Adriana Ferreira, líder de diversidade e inclusão da IBM América Latina. Ao final dos encontros coletivos, a empresa orienta os mentorados a realizar cursos relacionados aos temas abordados e a compartilhar os aprendizados com seus times. O Pride Alliance, grupo de afinidade para LGBTQIA+ da GE do Brasil, mantém um programa que orienta e tira dúvidas de lideranças sobre o tema.

Na Bayer, onde convivem quatro gerações de funcionários, executivos sêniores são mentorados por jovens profissionais durante seis meses. A ideia é mostrar que as gerações têm valores diferentes e que é possível trabalhar em conjunto sem conflitos geracionais. A Novelis, multinacional produtora de alumínio industrial, segue o mesmo modelo. "Uma boa comunicação entre as gerações gera uma cultura forte", acredita Glaucia Teixeira, vice-presidente de recursos humanos para a América do Sul. A empresa leva o tema tão a sério que até o presidente já participou do programa.

O Prêmio Lugares Incríveis para Trabalhar é uma iniciativa do UOL e da Fundação Instituto de Administração (FIA) que vai destacar as empresas brasileiras com os mais altos níveis de satisfação entre os seus colaboradores. Os vencedores serão definidos a partir dos resultados da pesquisa FIA Employee Experience, que mede o ambiente de trabalho, a cultura organizacional, a atuação da liderança e a satisfação com os serviços de RH. A pesquisa já está na fase de coleta de dados das empresas inscritas e os vencedores do Prêmio devem ser anunciados em agosto.