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Justiça proíbe transferência de cliente da Amil para outro plano de saúde

Cliente da Amil foi surpreendida ao chegar em hospital e ouvir de atendente que seu plano havia sido descredenciado - Divulgação/Amil
Cliente da Amil foi surpreendida ao chegar em hospital e ouvir de atendente que seu plano havia sido descredenciado Imagem: Divulgação/Amil

Henrique Santiago

Do UOL, em São Paulo

02/04/2022 04h00Atualizada em 05/04/2022 10h32

Uma cliente da Amil obteve na Justiça uma liminar que impede a transferência de seu plano de saúde para qualquer outra operadora de saúde. A ação foi movida após a empresa passar sua carteira de planos individuais e familiares para a APS (Assistência Personalizada à Saúde). Advogados dizem que a decisão é um ponto positivo para o consumidor, mas apresenta inconsistências.

Em 16 de março, o TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado São Paulo) deu parecer favorável à usuária da Amil. Além de impedir que seu convênio seja entregue para outra companhia do setor, o juiz Dimitrios Zarvos Varellis, da 11ª Vara Cível, dá cinco dias para a Amil restabelecer a cobertura de hospitais e laboratórios descredenciados com a troca de comando e manter o preço da mensalidade anteriormente contratada.

O descumprimento da ordem judicial ocasiona multa diária de R$ 10 mil a R$ 500 mil.

A beneficiária, uma idosa de 67 anos que preferiu não se identificar, diz ao UOL que foi a uma consulta médica no final de 2021 e foi informada pela atendente que seu plano havia sido descredenciado do hospital. Esse relato tem sido apresentado por diferentes clientes da Amil ouvidos pela reportagem desde que a APS assumiu o negócio.

A idosa começou a usar os serviços da Amil em 2006, depois que a Porto Seguro vendeu sua carteira individual para a concorrente. Atualmente, paga R$ 10 mil por mês na cobertura assistencial para ela e seus filhos.

"Fiquei surpresa porque isso nunca aconteceu antes. Pensei que a moça [do hospital] tinha me passado a informação errada", conta.

Procurada, a Amil declara à reportagem que não houve nenhum ajuste atípico da rede credenciada após a transferência da carteira.

Decisão vale apenas para a cliente

Ela entrou em contato com o escritório de advocacia Vilhena Silva, especializado em direito à saúde. O advogado Rafael Robba, porta-voz do Vilhena Silva, afirma que a determinação da Justiça é uma vitória para sua cliente, mas salienta que a liminar só é válida para ela. A Amil pode recorrer.

"É uma decisão temporária que tem validade até ser revogada ou confirmada. Pode ser definitiva, ainda que caiba recurso, ou o juiz pode anular se a Amil trouxer elementos que convençam o juiz do contrário", explica.

No documento, o juiz Varellis traça uma linha do tempo com fatos datados entre novembro de 2021 e fevereiro de 2022 que envolvem as movimentações da operadora de saúde.

Traz o surgimento da Fiord Capital, empresa que seria responsável por assumir a carteira da Amil, a transferência de 337 mil contratos da Amil para a APS e a suspensão pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) da aquisição do controle societário da companhia por um grupo formado por duas empresas - entre elas a Fiord — e uma pessoa jurídica.

Segundo o texto, a decisão aponta incerteza em relação a uma prestação de serviços à cliente de forma adequada. "A Amil providenciou a transferência de toda a sua carteira de planos individuais e familiares com injustificada celeridade (apenas quatro meses) e sem demonstrar de forma adequada aos milhares de consumidores a solidez e confiabilidade das empresas envolvidas no negócio."

Melissa Kanda, advogada especialista em direito médico, declara que a liminar é um avanço na defesa ao consumidor, uma vez que os clientes da Amil têm acumulado reclamações referentes a perdas de direito. A carteira transferida à APS inclui usuários de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná.

"Não acredito que essa liminar seja cassada por causa também da notoriedade [do assunto] na mídia", diz.

Advogado vê acertos e erros

Na visão do advogado Gustavo Martinelli, especialista em direito econômico, a liminar apresenta algumas falhas. Ele diz que não é possível afirmar que a cliente dificilmente não teria condições de contratar um plano de saúde similar sem alto custo e longas carências, conforme consta no documento.

Martinelli cita, por exemplo, a Resolução Normativa 438/18 da ANS, que permite a portabilidade de carências desde que o plano de saúde esteja ativo, pago em dia e com prazo de permanência devidamente cumprido, de dois a três anos..

"Se ela fosse transferida para outro plano, não precisaria cumprir prazo de carência. Ou até mesmo se quisesse contratar um terceiro plano no mercado", avalia.

O advogado declara que a Amil dificilmente irá tentar invalidar a liminar, por acreditar que os argumentos eventualmente utilizados na decisão judicial de um caso individual serviriam de material para outros julgamentos, o que é chamado de precedente judicial.

Ainda que seja provisória, a liminar perderia efeito se a transferência da carteira da APS para o grupo de empresários for aprovada, diz Martinelli.