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Reinaldo Polito

Quem presta atenção nos políticos?

Casso/UOL
Imagem: Casso/UOL

14/09/2014 06h00

Alguns cientistas políticos afirmam que “conteúdo programático” não interfere na intenção de voto dos eleitores. Ora, se eles estão certos em suas avaliações, como explicar então que os indicadores levantados pelos diversos institutos de pesquisa oscilam todas as semanas, tanto na escolha para presidente, como para governadores e senadores?

Com certeza essas variações na intenção de votos não se devem apenas aos comícios em praças públicas, nem ao trabalho corpo a corpo dos candidatos, e muito menos ainda à distribuição de santinhos. Se não são apenas esses motivos, as mudanças só podem ocorrer por causa dos debates e das propagandas eleitorais nos horários gratuitos pelo rádio e pela televisão.

Quem, entretanto, presta atenção no que os políticos dizem no horário eleitoral gratuito? Parece que uma boa parcela da população acompanha com interesse o que os candidatos estão dizendo, tanto que, além de alguns ratificarem sua opinião, outros chegam a mudar de ideia e escolher candidato diferente.

Para fazer com que o eleitor fique atento e tenha interesse em sua mensagem, o político precisa observar quatro pontos importantes no processo de comunicação: benefício, expectativa, novidade e interatividade. Todos esses requisitos atuam de forma independente em determinados momentos, e inter-relacionada na maioria dos casos.

Benefício

As pesquisas qualitativas mostram o que os eleitores desejam que seus candidatos façam se forem eleitos. Uns julgam que a saúde é o fator mais relevante, outros imaginam ser a educação, e assim com todas as questões – desenvolvimento econômico, transporte, segurança, meio ambiente etc.

Portanto, não basta ao político apenas mostrar ao eleitor qual será o benefício que ele teria votando no seu nome, mas sim o benefício que o eleitor efetivamente deseja.

Dizer que o meio ambiente será sua grande plataforma política diante de eleitores que estão preocupados com a manutenção ou conquista de emprego seria um discurso equivocado e improdutivo.

Expectativa

O bom candidato sabe como colocar uma espécie de cenoura na frente do eleitor para que fique com sua expectativa alimentada e realimentada para o surgimento de uma informação interessante e até surpreendente.

Sem expectativa, dificilmente alguém consegue acompanhar com interesse o raciocínio do orador.

Novidade

O pensamento do eleitor é arisco. As pessoas perdem a concentração até com certa facilidade. Estão ali na frente do televisor ou grudados no aparelho de rádio acompanhando a mensagem do candidato, mas, como o pensamento trabalha numa velocidade muito mais rápida que as palavras, passam a pensar em seus compromissos, afazeres, pendências e se deligam do que estavam acompanhando.

Por isso, o candidato precisa de quando em quando mostrar uma novidade, passar uma informação contundente, que mantenha a concentração do eleitor e até resgate sua atenção, motivando-o a acompanhar sua linha de pensamento e suas propostas de governo.

Pausas expressivas, comunicação fisionômica e gesticulação também podem ajudar nessa tarefa.

Interatividade

Em sala de aula, um professor pode sugerir trabalhos individuais ou em grupo, fazer perguntas, se movimentar no meio do grupo para promover interatividade com os alunos. Na comunicação dos políticos será quase impossível lançar mão desses recursos, exceto em alguns comícios mais restritos.

Na comunicação pelo rádio e pela televisão, a interatividade só pode ser estabelecida pelo convite à reflexão. Quando o candidato pede ao ouvinte ou telespectador que reflita sobre determinado ângulo de um assunto que seja do seu interesse, se conseguir que ajam assim estabelece interatividade com os eleitores.

Enquanto o eleitor pensa na resposta àquela reflexão ou nas consequências do problema proposto, está efetivamente participando do processo de comunicação e, dessa forma, poderá continuar motivado em acompanhar o que o candidato tem a dizer.

Desconstruir a imagem dos adversários dá tempero aos discursos

Além desses quatro pontos, há outros que podem conquistar a atenção do eleitor: a história de vida do candidato, suas realizações, sua credibilidade, os aspectos emocionais em que se envolveu e tantos outros que se adicionam para que alguém possa ter interesse em ouvir políticos falando nos horários eleitorais gratuitos.

Lógico que desconstruir a imagem dos adversários, mostrando como suas promessas são fantasiosas ou mentirosas ajuda a dar tempero aos discursos e a conquistar votos. O perigo é passar do ponto e ser visto com alguém que só critica por criticar, com interesse eleitoreiro.

Nesse caso, as críticas funcionam como espécie de bumerangue. As acusações e críticas se voltam para quem as formulou e, ao invés de conquistar, o candidato acaba perdendo votos. Uma palavra mal proferida, uma resposta equivocada pode ser suficiente, às vezes, para jogar por terra o trabalho de toda uma campanha.

"Era só coisa de campanha"

É uma tarefa árdua para o político conquistar e manter atenção dos eleitores. Talvez tão difícil quanto para nós, eleitores, aguentarmos esses infindáveis discursos que, como sabemos, muitas vezes são impregnados de inverdades e falsas promessas.

Aos que ainda hesitam em pôr em dúvida a palavra e as promessas da maioria dos políticos, basta lembrarmos de que alguns deles, depois das eleições, ao explicarem determinadas opiniões, dizem simplesmente: "ah, isso era só coisa de campanha eleitoral".

SUPERDICAS DA SEMANA

- Lembre-se sempre de que nós ouvintes somos egoístas e interesseiros. Só prestamos atenção se percebermos que teremos algum tipo de benefício
- Procure criar expectativa para que o ouvinte acompanhe seu raciocínio com interesse
- De vez em quando, mostre uma novidade para manter e resgatar a atenção dos ouvintes
- Estabeleça interatividade com os ouvintes, para que sintam estar participando do processo de comunicação

Livros de minha autoria que podem ajudar na reflexão desse tema: “Como falar corretamente e sem inibições”, “Assim é que se fala”, “Conquistar e influenciar para se dar bem com as pessoas” e “Superdicas para falar bem”, publicados pela Editora Saraiva.