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Nova corretora da Bolsa só cobrará taxa se cliente tiver lucro com ações

Renato S. Cerqueira/Futura Press/Estadão Conteúdo
Imagem: Renato S. Cerqueira/Futura Press/Estadão Conteúdo

Téo Takar

Do UOL, em São Paulo

17/07/2018 04h00Atualizada em 29/08/2018 14h11

Nos últimos seis anos, nenhuma nova corretora de ações na Bolsa foi aberta no Brasil. Em dez anos, quase 30 corretoras fecharam. Os impostos são complicados, faltam incentivos e conhecimento para o brasileiro investir em ações, mesmo com os juros em baixa e a renda fixa trazendo menos retorno.

A corretora Toro Investimentos estreiou nesta terça-feira (17) com novidades para tentar encarar a situação: só vai cobrar taxa pelas operações de compra e venda de ações se o cliente tiver lucro na operação.

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Criada a partir da Toro Radar, uma fintech (empresa de tecnologia que presta serviços financeiros) de educação financeira, a Toro Investimentos anunciou uma pretensão ambiciosa, de praticamente dobrar o número de pessoas físicas que acessam a B3 para negociar ações, opções e outros ativos de renda variável.

Nova proposta de corretagem

A Toro só cobrará a taxa se o cliente tiver lucro na operação, desde que ela tenha sido recomendada pelos analistas da corretora. Nesse caso, a taxa será equivalente a 10% do lucro obtido pelo cliente no investimento realizado pela plataforma da corretora.

“É um modelo de ‘pricing’ [preço dos serviços] inédito no Brasil. Um modelo de ganha-ganha. O cliente ganha, nós ganhamos", disse Gabriel Kallas, um dos fundadores da Toro.

As corretoras que estão no mercado hoje cobram desde R$ 0,80 até R$ 20,00 por operação de compra ou venda, independentemente de o cliente ter lucro ou não com a transação.

Para operar na bolsa, o pequeno investidor precisa necessariamente escolher uma corretora credenciada, que pode ser independente ou vinculada a um banco, e utilizar sua plataforma eletrônica, conhecida como “home broker”.

Buscador simplificado de investimentos

Além da novidade no segmento de renda variável, a Toro também quer facilitar o acesso do investidor a produtos de renda fixa. Para isso, desenvolveu uma ferramenta semelhante aos sites que buscam hotéis e passagens aéreas. Os principais investimentos para cada perfil de cliente poderão ser visualizados simultaneamente, permitindo comparar as taxas, tributações e rentabilidades.

Segundo Kallas, o objetivo da Toro é atrair clientes que ainda não operam na Bolsa e que não realizam investimentos fora dos grandes bancos porque não entendem como funcionam o mercado e os produtos financeiros.

“Queremos simplificar. A experiência de investimento tem que ser tão simples como comprar um livro pela internet. As plataformas que existem hoje dão liberdade de escolha ao cliente, mas são ambientes hostis, complexos”, declarou Kallas.

A Toro dará acesso gratuito aos cursos e análises da Toro Radar, braço de educação da empresa. A lista de serviços disponíveis aos clientes inclui ainda uma assessoria de investimentos digital, ou seja, um computador capaz de tirar as principais dúvidas sobre aplicações.

De plataforma de educação para corretora de valores

A Toro Investimentos tem sua origem na Toro Radar, uma empresa de tecnologia fundada em 2010 por cinco jovens estudantes de Administração do Ibmec, em Belo Horizonte (MG), para disseminar educação financeira e ajudar pequenos investidores a tomar decisões, oferecendo cursos online, relatórios de análise de empresas listadas na bolsa e recomendações de investimento.

“O maior valor que você pode entregar a alguém é a educação”, diz Kallas, que tomou a iniciativa de fundar a Toro depois assistir aulas de finanças em uma universidade do Colorado, nos Estados Unidos. “Era uma visão completamente diferente do que existia no Brasil. Com foco estratégico. Lá, você tem a figura do Advisor [consultor de investimentos]. Aqui, a gente ainda depende do gerente do banco."

Kallas, na época com 18 anos, apresentou a ideia aos amigos João Resende e Márcio Placedino. Os três logo se juntaram a Gustavo Mendes e Guilherme Alves para lançar a Toro Radar. Além do boca-a-boca, o grupo apostou forte no marketing digital, explorando banners de propaganda em sites.

Em 2012, a Toro passou a oferecer também serviço de acesso à Bolsa de Valores, utilizando a estrutura tecnológica da XP Investimentos. “Já era possível comprar ações pela Toro, mas nós considerávamos que ainda não era o ideal. Queríamos oferecer a melhor experiência digital em investimentos para nossos clientes”, afirma.

Em 2016, a Toro recebeu um investimento de R$ 46 milhões de um grupo de cinco investidores em troca de uma participação de 25% na empresa. Entre os novos sócios-investidores está Eugênio Mattar, presidente da empresa locação de veículos Localiza.

Gabriel Kallas - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

“Com o aporte desses investidores, pudemos dar sequência ao plano de aperfeiçoar nossa plataforma de investimento e ter a nossa própria corretora”, diz Kallas.

Novos clientes ou jogo de "rouba-monte"?

A Toro Investimentos quer praticamente dobrar o número de pessoas físicas que acessam a Bolsa para negociar ações, opções e outros ativos de renda variável. "O objetivo é chegar a 500 mil contas nos próximos 12 meses", afirma Gabriel Kallas, um dos fundadores da Toro.

Para justificar sua pretensão, Kallas cita o número pequeno de investidores na Bolsa em comparação com a população do país. “Hoje, apenas 0,3% da população brasileira investe na Bolsa. Em países emergentes semelhantes ao Brasil, esse número chega a 5%. Nos Estados Unidos, 60% investem em ações.”

Caio Weil Villares, presidente da Ancord (Associação Nacional das Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, Câmbio e Mercadorias) elogia a iniciativa da Toro, mas ainda vê um potencial limitado de crescimento do mercado brasileiro.

“Eu bato palmas para eles. Não me lembro quando foi a última vez que tivemos uma corretora nova na Bolsa. Mas o mercado brasileiro ainda é muito limitado, tanto pelo número de investidores como pela quantidade de empresas listadas na Bolsa”, afirma Villares.

“Espero que a Toro consiga realmente expandir o mercado. Caso contrário, corremos o risco de voltar ao jogo de ‘rouba-monte’. Ou seja, em vez de conquistar novos clientes, você lança um produto com marketing agressivo, mas apenas consegue tirar clientes de outras corretoras”, diz o presidente da Ancord.

Faltam estímulos para mercado crescer, diz associação

Villares diz que o mercado viveu um longo período de encolhimento. Nos últimos dez anos, quase 30 corretoras fecharam as portas. Hoje, cerca de 50 instituições estão atuantes no segmento Bovespa, voltado à negociação de ações na B3.

O número de investidores cadastrados na Bolsa, que estava praticamente congelado na casa dos 600 mil desde 2010, voltou a crescer em 2017 e já superou a casa de 700 mil pessoas físicas em 2018.

A queda na taxa básica de juros, a Selic, a partir do fim de 2016 ajudou na retomada do interesse dos investidores pelo mercado de ações.

“O juro alto já não está mais presente. Mas cultura de investimento não se muda do dia para a noite. A maioria das pessoas ainda continua contente com o rendimento da poupança. É preciso reeducar o investidor, mostrar que ele precisará correr risco no mercado de capitais para poder ganhar mais.”

Além da questão cultural, Villares defende um aumento dos estímulos do governo para levar as pessoas a investir em ações.

“Uma das questões que precisam ser melhoradas é a da tributação. O recolhimento de Imposto de Renda sobre ações é muito complexo. Você precisa criar uma estrutura simplificada e que estimule o pequeno investidor.”