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Reinaldo Polito

Coronavírus faz vítima na oratória: Olto Mariano

Colunista do UOL

01/05/2020 21h45

Dar o exemplo não é a melhor maneira de influenciar os outros. É a única

Albert Schweitzer

Aprendi com a minha amiga Ireniza Canavarros. Essa psicoterapeuta de Cuiabá me ensinou uma lição que jamais esqueci: Polito, viver é a arte de administrar perdas. Infelizmente, nos últimos dias, tenho experimentado, com muita tristeza, o aprendizado dessa máxima, e confesso que, apesar de não ser jovem, passar por tal processo continua ainda a ser muito doloroso. Na mesma semana, perdi duas pessoas que admirava muito. Falei no último texto de João Mellão Netto, e hoje não posso deixar de falar de um outro amigo e importante personalidade brasileira que se foi, Olto Mariano.

Nessas quatro décadas em que ministro cursos de oratória, já tive a oportunidade de conhecer muitos professores da Arte de Falar em Público. Alguns surgem e desaparecem como se fossem verdadeiros cometas, pois descobrem que para permanecer nessa atividade é preciso mais que competência, é necessário empenho, estudo constante e desprendimento. Outros, ao contrário, verdadeiros apaixonados pelo ensino dessa arte, permanecem para sempre.

Olto Mariano foi um professor exemplar

Olto Mariano foi um desses raros casos de extrema abnegação. Radicado em Minas Gerais, conversamos muitas vezes por telefone. E as nossas conversas, invariavelmente, giravam em torno da oratória. Olto sempre me indagava sobre os cursos que eu realizava em São Paulo e contava as histórias do trabalho que desenvolvia. E, principalmente, de como se sentia bem em poder ajudar as pessoas a se expressarem em público com confiança e desembraço. Sempre que aparecia alguém da região de Belo Horizonte querendo fazer curso de oratória eu indicava Olto Mariano. Sabia que o aluno estaria em boas mãos.

Ficou imensamente feliz quando publicou seu livro "Fale em público sem professor". Era a oportunidade de levar seu conhecimento e enorme experiência a mais pessoas por todos os cantos do país. Conversava com voz calma e serena. Ouvia com atenção. Na sua própria maneira de se comunicar, dava o exemplo de como alguém devia se expressar em público. Era a coerência entre o que ensinava e a forma como agia.

Pai do secretário de Estado de Planejamento e Gestão de Minas, Otto Levy, Olto morreu na última segunda-feira, 27, vitimado pelo coronavírus, depois de ter permanecido internado em Belo Horizonte por 26 dias. Ele estava com 89 anos. Nasceu em Ipuiuna, pequena cidade do Sul de Minas Gerais, com pouco mais de dez mil habitantes.

Deixou um legado

Olto Mariano não só preparou milhares de pessoas para falar em público com seus cursos e pelas lições de seu livro, como também habilitou muitos professores de oratória, que hoje multiplicam suas lições por todo o país. Será lembrado para sempre com admiração e respeito pelo maravilhoso trabalho que desenvolveu e pelo invejável legado que nos deixou.

Quando seu filho Igor me escreveu para contar sobre o falecimento de seu pai, uma profunda tristeza se abateu sobre mim. Por sua dedicação à oratória, uma atividade pela qual também tenho dedicado a minha vida, foi como se um pedaço de mim também tivesse sido arrancado.

Olto era daquelas pessoas que deixam marcas naqueles com quem convive. Não havia nele uma "agenda escondida". Era transparente, autêntico e verdadeiro. São aquelas qualidades que, como Diógenes afirmava, procuramos com uma vela dentro da nossa sociedade. Tive muita sorte em conhecê-lo.

Tomara que o seu exemplo possa servir de espelho a muitos outros profissionais, e que seu legado continue ajudando mais e mais pessoas a se comunicarem com segurança e eficiência. Obrigado, querido Olto Mariano por tudo o que nos proporcionou nesses seus 89 anos de vida tão produtiva.

Superdicas da semana

- Que faz com amor o seu trabalho faz da sua atividade um lazer

- Há profissões que exigem competência, mas também amor e dedicação

- Mesmo que alguns alunos não se deem conta, alguns professores permanecem para sempre em suas vidas

- Alguns professores chegam a ensinar mais por seus exemplos que por suas aulas

Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Como falar de improviso e outras técnicas de apresentação", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.

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