Improvisar é dizer o que pensamos e não pensar o que dizemos.
Sofocleto
Sempre fui um admirador da oratória de Lula. Nesta coluna, tive a oportunidade de escrever diversos artigos enaltecendo sua capacidade para se comunicar com os mais diferentes tipos de plateias. Movido por uma intuição adestrada ao longo de décadas de embates sindicalistas e comandando as ações do PT (Partido dos Trabalhadores), sabe como poucos usar o microfone.
Só para citar dois exemplos dos textos que já escrevi no UOL enaltecendo a sua comunicação: em setembro de 2008, publiquei "Aprenda com Lula - o mestre da oratória". Em abril de 2018, o título foi "Lula fala melhor de improviso". Especialmente nas ocasiões em que o presidente fala de improviso sua oratória é arrebatadora.
Lula deve falar para todos
Enfim, foram dezenas de análises a respeito da maneira de Lula se expressar em público. Foi com essa habilidade verbal que conseguiu todas as suas vitórias políticas. Conquistou uma legião de seguidores que ficam extasiados ao ouvi-lo, independentemente da mensagem transmitida e da qualidade do conteúdo abordado.
De uns tempos para cá, tendo em vista a velocidade com que seus discursos chegam aos brasileiros por meio das redes sociais, algumas de suas apresentações se mostraram inadequadas. Acostumado a falar para o pessoal da sua bolha, parece que se esquece, às vezes, de que, como presidente do país, sua fala interessa a toda nação.
Começou a ler
Até em pronunciamentos internacionais, seus improvisos foram equivocados. Em maio de 2022, por exemplo, em entrevista à revista Time, atravessou o samba. Disse que o presidente ucraniano, Volodmyr Zelensky, fora tão culpado na guerra entre Rússia e Ucrânia quanto Putin. Até os membros do seu partido arrancaram os cabelos com essa declaração.
Por esse e outros motivos, já na campanha, depois de fornecer munição valiosa aos opositores, para não correr riscos, ao falar no lançamento de sua pré-campanha ao lado de Alckimin, achou por bem ler o discurso. Dessa forma, teve condições de pesar e sopesar cada uma de suas palavras para não dizer o que não deveria.
Vantagens e desvantagens
Está certo que ao ler, ainda que tenha a vantagem de medir criteriosamente cada uma de suas frases, perde um pouco da leveza e eloquência das suas manifestações improvisadas. Por outro lado, pensando em Lula hoje, ninguém obriga um presidente da República a falar de improviso. A importância das mensagens do primeiro mandatário da Nação o autoriza a se apresentar com o discurso no papel, ou no teleprompter.
Se observarmos os grandes líderes mundiais, vamos constatar que quase todos se valem do teleprompter para discursar. Ninguém estranha, já que faz parte de uma espécie de tradição para a liturgia do cargo. Uma rápida olhada nas apresentações dos quatro últimos presidentes norte-americanos confirma que todos eles, na maioria das circunstâncias, liam.
Lula tem falado o que não deve
Nos últimos tempos, Lula tem se manifestado de maneira meio atabalhoada. Sem nenhuma necessidade, toca em temas espinhosos, para os quais precisa depois dar explicações com o objetivo de dizer que não disse o que disse. É muito desgastante e arriscado. Poderia muito bem se livrar dessas saias justas se mandasse preparar suas falas e se limitasse a ler.
O editorial da Folha, de domingo, 19, relacionou alguns temas tratados de maneira inconveniente por Lula. Foram citados pronunciamentos equivocados como, por exemplo, "preguiça dos indígenas", "miscigenação como lado bom da escravidão" e "malefícios da obesidade".
Munição para os opositores
Será que alguém tem dúvida de que a oposição já está colecionando essas pérolas para atacá-lo na primeira oportunidade? Se não agora, um pouco mais à frente durante a campanha eleitoral esses desacertos virão à tona. Talvez seja a hora de pôr a vaidade um pouco de lado e se submeter aos discursos preparados com rigor técnico por profissionais competentes.
Quem conhece Lula sabe que ele não se sujeitaria de corpo e alma ao que for sugerido por seus assessores. Nem precisa agir assim. Bastaria que lesse atentamente as mensagens elaboradas por seus auxiliares e desse um toque pessoal no texto. Dessa forma, deixaria os discursos com a sua cara, sem correr o risco de meter os pés pelas mãos.
Superdicas da semana
- A leitura bem-feita pode ser tão eficiente quanto a fala de improviso
- Nem sempre o discurso pode ser improvisado
- Um presidente pode ler seus discursos
- O improviso deve ser deixado às situações mais amenas
Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "Como Falar Corretamente e sem Inibições", "Saiba dizer não", "Comunicação a distância", "Os segredos da boa comunicação no mundo corporativo" e "Oratória para advogados", publicados pela Editora Saraiva. "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante. "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.
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