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Apps, gincanas e premiações são táticas contra o sedentarismo no trabalho

Um estudo da Fiocruz, UFMG e Unicamp revela que 46% dos brasileiros que costumavam se exercitar de três a quatro vezes por semana interromperam o hábito na pandemia. De olho no bem-estar e na produtividade dos funcionários, empresas estão inovando para estimulá-los a sair do sedentarismo. - Anupam Mahapatra/Unsplash
Um estudo da Fiocruz, UFMG e Unicamp revela que 46% dos brasileiros que costumavam se exercitar de três a quatro vezes por semana interromperam o hábito na pandemia. De olho no bem-estar e na produtividade dos funcionários, empresas estão inovando para estimulá-los a sair do sedentarismo. Imagem: Anupam Mahapatra/Unsplash

Julia Moióli

Colaboração para o UOL, em São Paulo

15/03/2022 04h00

O analista administrativo Alexandre Luiz Lopes parou de praticar atividades físicas no início da pandemia de covid-19, quando adotou o isolamento social e passou a trabalhar de casa. Com uma redução de membro inferior causada por um acidente, logo sentiu os efeitos de ficar parado.

A analista de investimentos Thainá Cervera, que sempre praticou esportes para controlar a ansiedade, experimentou a mesma mudança, e a gerente de projetos Rafaela Graeff, corredora convicta antes do nascimento do filho, viu seus planos de retomada de uma rotina saudável ficarem mais distantes.

Para interromper o sedentarismo dos primeiros meses de pandemia, os três tiveram um empurrãozinho das empresas em que trabalham, que entraram em ação com ferramentas inovadoras de incentivo à prática de atividade física, como desafios e prêmios. As novas estratégias foram tão bem recebidas pelos colaboradores que, de acordo com os entrevistados, devem permanecer na lista de benefícios oferecidos mesmo após a retomada do trabalho presencial.

Parada generalizada

Assim como Alexandre, Thainá e Rafaela, milhões de brasileiros pararam de se movimentar durante a pandemia, especialmente na primeira onda de contágio, em 2020. Se os números brasileiros já chamavam atenção antes —em 2019, mais de 40% dos adultos eram considerados insuficientemente ativos, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)—, com o isolamento social, a situação piorou e fez com que mais pessoas parassem totalmente.

O estudo ConVid - Pesquisa de Comportamento, realizado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), descobriu que 62% da população não realizou qualquer atividade física durante a pandemia. Entre quem tinha o hábito de se exercitar de três a quatro vezes por semana, 46% pararam.

Pedro Reis, sócio-fundador da VIK - Acervo pessoal - Acervo pessoal
A crescente demanda por serviços de incentivo à atividade física no trabalho fortalece outras empresas. É o caso da VIK, fundada por Pedro Reis, que oferece soluções de gamificação e de redes sociais para promover saúde e bem-estar.
Imagem: Acervo pessoal

"Quando as pessoas param de fazer atividade física, elas ficam mais estressadas, se alimentam e dormem pior e isso diminui o engajamento no dia a dia da empresa", afirma Pedro Reis, sócio-fundador da VIK, que oferece soluções de gamificação e redes sociais voltadas à saúde e ao bem-estar.

Nos últimos meses, inclusive, a VIK viu a demanda pelo seu serviço de incentivo à atividade física crescer consideravelmente. Um aplicativo da empresa ajudou o iFood a manter seus funcionários ativos. "Temos uma boa estrutura para atividade física no escritório, mas com o trabalho remoto não era mais possível utilizá-la", conta Vera Lúcia Gonçalves Nascimento, analista de saúde da empresa de delivery de refeições. "Procuramos, então, uma alternativa mais estimulante."

Vera Lúcia Gonçalves Nascimento, analista de saúde do iFood - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Vera Lúcia Gonçalves Nascimento, analista de saúde do iFood, conta que a empresa contratou um aplicativo da VIK para estimular os funcionários a sair do sedentarismo.
Imagem: Acervo pessoal

Depois de baixar o app e preencher um cadastro, os participantes enfrentam desafios que duram cerca de 90 dias e acumulam VIK bônus, que podem ser trocados por vouchers de até R$ 500 na rede de lojas de material esportivo Centauro. Ao final do período, também são feitas doações para organizações não governamentais —quanto mais os funcionários se exercitam, mais as instituições recebem. A solução da VIK permitiu que o iFood acompanhasse a adesão e as participações, e os números indicam que a iniciativa veio para ficar.

Incentivos extras

Na Votorantim, o clima de competição do Desafio V Saúde animou a analista de investimentos Thainá Cervera a se movimentar. Com o sono desregulado e sofrendo de ansiedade, ela baixou o aplicativo e passou a correr ao ar livre ou a reservar horários na academia do prédio.

Pelo programa, os participantes compartilham fotos das rotinas de exercício, o que incentiva os colegas a se mexer também. "Até nosso CEO entrou no desafio e isso serviu de incentivo para não ficarmos parados", conta Thainá. Em paralelo, cumpre-se uma lista de hábitos saudáveis. Tudo isso gera pontos que podem ser trocados por prêmios. A empresa se prepara para lançar a segunda edição do programa agora, em paralelo ao retorno presencial.

Assim como a VIK, outras empresas de benefícios se adaptaram à nova realidade para estimular a atividade física. A plataforma corporativa de atividade física Gympass, por exemplo, passou a oferecer aulas online. O modelo foi considerado atrativo pela Siemens, empresa alemã de automação, softwares, energia e serviços, como parte de um programa maior, que foca nos diversos aspectos de saúde importantes para os colaboradores.

"Não existe mais separação entre vida pessoal e profissional: para uma pessoa estar com atenção plena em suas atividades, ela não pode estar com dores ou sofrimento emocional e nós, como empresa, precisamos oferecer essas condições", afirma Caroline Zilinski, diretora de pessoas e organização.

A Visa optou por atuar em duas frentes: além de oferecer aulas de técnicas de meditação e respiração, passou a estender sua política de reembolso de aulas de atividade física à compra de equipamentos esportivos, como tapetes de ioga, rubber band (elástico para fazer exercícios) e outros.

"A adesão aumentou —hoje 72% dos colaboradores utilizam esse incentivo— e ele já foi incorporado à nossa lista de benefícios", conta Priscila Monaco, diretora de RH da Visa do Brasil. "Se a pessoa não está equilibrada, com a cabeça e a mente sãs, e o corpo relaxado e centrado, dificilmente terá um bom rendimento dentro da companhia."

Fortalecendo a integração

Além de combater o sedentarismo, as empresas perceberam que estimular a saúde física do colaborador trouxe um ganho inesperado: a integração entre funcionários.

Hoje, por exemplo, liberar 30 minutos na agenda para a Iive de ginástica do programa Movimenta VR é a primeira coisa que o analista administrativo Alexandre Luiz Lopes faz todas as manhãs ao ligar seu computador. "No começo da pandemia, eu estava travado em casa, dentro do meu bunker", conta. Deu tão certo que ele perdeu seis quilos em seis meses. "Consegui um momento de relaxamento físico antes de encarar um dia de trabalho e até minha respiração melhorou. Além disso, tive a oportunidade de fazer contato com pessoas da empresa que eu só via em reuniões virtuais."

O Movimenta VR surgiu depois de uma pesquisa interna, quando os funcionários da VR Benefícios revelaram sentir falta de atividades físicas no início da pandemia. As aulas de ginástica atraem mais de 750 funcionários. "Temos quase 90% de satisfação com nossas iniciativas de saúde e bem-estar e esse número cresceu 20% nesses últimos dois anos", conta João Altman, diretor-executivo de pessoas e cultura.

Rafaela Graeff, gerente de projetos da CCEE - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Rafaela Graeff, gerente de projetos da CCEE, voltou à rotina de exercícios e alimentação saudável por causa da gincana de esportes e saúde promovida pela empresa.
Imagem: Acervo pessoal

Na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE, foi organizada a gincana Vida Ativa, com os funcionários divididos em grupos para também estimular a atuação em conjunto. As equipes pontuavam à medida que postavam fotos praticando atividade física ou comendo itens saudáveis. Foi assim que a colaboradora da área de planejamento e projetos Rafaela Graeff se animou a andar de bicicleta todos os dias e a se alimentar melhor depois do nascimento do filho e dos primeiros meses de pandemia.

Os resultados foram positivos não só para Rafaela mas para a maioria dos funcionários. Entre os participantes, 92% começaram a praticar alguma atividade física, 80% tiveram hábitos saudáveis incorporados à rotina e 61% conseguiram engajar alguém da família. "Acreditávamos que o programa, assim como outros, teria o engajamento de 20% ou 30% da organização, mas chegamos a mais de 50%", comemora Tiago Hayashida, gerente executivo de gestão de pessoas da CCEE, confirmando que a pandemia colocou saúde e bem-estar na pauta do dia das empresas - e incentivos à prática de esportes são mais percebidos e valorizados pelos colaboradores.

Lugares Incríveis para Trabalhar

O Prêmio Lugares Incríveis Para Trabalhar é uma iniciativa do UOL e da FIA para reconhecer as empresas que têm as melhores práticas em gestão de pessoas. Os vencedores são definidos a partir da pesquisa FIA Employee Experience (FEEx), que mede a qualidade do ambiente de trabalho, a solidez da cultura organizacional, o estilo de atuação da liderança e a satisfação com os serviços de RH. As inscrições para a edição 2022 estão abertas e vão até 30 de maio.