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REPORTAGEM

Itapemirim voa com menos assentos, bagagem grátis e promessa de refeições

Itapemirim estreia sua companhia aérea com objetivo de retomar o glamour da aviação - Alexandre Saconi/UOL
Itapemirim estreia sua companhia aérea com objetivo de retomar o glamour da aviação Imagem: Alexandre Saconi/UOL

Alexandre Saconi*

Colaboração para o UOL, em São Paulo

29/06/2021 16h37

A Itapemirim Transportes Aéreos realizou seu primeiro voo com passageiros nesta terça-feira (29), ligando o aeroporto de Guarulhos (SP) ao de Brasília (DF). A empresa parte com uma proposta de menos assentos por aeronave e despacho gratuito de bagagens, na contramão do mercado atual.

Na primeira decolagem, realizada às 10h, estavam presentes apenas executivos da empresa e convidados. Esse é o pontapé das operações da empresa, que iniciará os voos comerciais na quinta-feira (1º). Isso ocorre após pouco mais de um ano desde o anúncio de sua criação, em fevereiro de 2020.

O grupo Itapemirim, que tem forte presença no transporte terrestre com a Viação Itapemirim de ônibus, já teve uma companhia aérea antes e voltou ao mercado aéreo. O UOL participou da viagem e conversou com executivos para saber quais são os planos para o futuro da empresa.

Marcação de assentos e bagagem grátis

A empresa promete que a marcação de assentos e o despacho de bagagens serão gratuitos para sempre, o que vai contra as demais empresas do setor. Nos últimos anos, a tendência é a cobrança pelos serviços.

Outra proposta da empresa que não segue o rumo atual da indústria é diminuir a quantidade de pessoas transportadas no avião, proporcionando maior conforto. Isso deve ter impacto no valor do bilhete, pois, quanto maior o espaço entre as poltronas, menos passageiros.

Segundo o presidente do grupo, Sidnei Piva de Jesus, o que irá permitir essa iniciativa é a redução da margem de lucro da empresa. "Todos os benefícios serão mantidos. Esse é o processo Itapemirim de voar", disse o empresário.

Promessa de refeições a bordo

Ita interior - Alexandre Saconi - Alexandre Saconi
Interior do avião Airbus A320 que realizou o primeiro voo da Itapemirim Transportes Aéreos
Imagem: Alexandre Saconi

A empresa retorna ao setor com o objetivo de resgatar o glamour da aviação. Para isso, oferece diferenciais diante de um mercado com confortos cada vez mais escassos em favor de passagens mais baratas.

O espaço para os assentos é maior que o habitual, com aproximadamente 78 centímetros entre um assento e outro. A companhia também pretende oferecer refeições em seus voos quando a pandemia acabar, fugindo do padrão de lanches e salgadinhos (chamados de snacks), mais comumente encontrados hoje em dia nos aviões.

O avião em que a reportagem viajou, um Airbus A320, estava configurado para comportar 162 passageiros, frente à capacidade para até 174 pessoas a bordo nas aeronaves da concorrência. Essa, entretanto, não deve ser a regra da companhia, que poderá ter interiores diferentes, mas com foco em manter o espaço para as pernas.

No modelo que voou nesta terça-feira, os bancos não reclinavam, mas, segundo a empresa, outros modelos deverão oferecer essa possibilidade.

Sem aplicativo e com assentos temporários

Ainda neste voo inicial, a empresa não estava com os assentos que utilizará em definitivo em seus aviões. Além disso, o site não estava otimizado para ser acessado em celulares e não havia um aplicativo para realizar o check-in online. Piva disse que essas limitações são temporárias e devem ser resolvidas em breve, sem atrapalhar as operações da aérea.

Em um mercado no qual grande parcela dos passageiros busca priorizar preço menor, em vez de experiências luxuosas, o desafio a ser enfrentado pela Itapemirim é grande.

Ela terá de saber equilibrar a oferta de passagens a um preço atrativo diante de um público consumidor que pode se incomodar diante de serviços considerados gratuitos embutidos no preço final da passagem.

Empresa está em processo de recuperação judicial

Um dos fantasmas que assombram a nova empresa é a recuperação judicial pela qual o grupo vem passando desde 2016. Segundo relatório da administradora judicial responsável pelo processo, a EXM Partners, ao qual o UOL teve acesso, a empresa tinha dívidas de cerca de R$ 250 milhões apenas em seu plano de recuperação.

Somado a isso, a empresa chegou a ter dívidas tributárias com a União, estados e municípios que chegavam a R$ 2 bilhões em 2019. Em entrevista à imprensa durante a cerimônia de realização do primeiro voo, Piva disse que a empresa já cumpriu o prazo da recuperação judicial, que é de dois anos, e já fez o pedido à Justiça para que o processo seja encerrado. Ainda assim, o compromisso de pagamento se estenderá por mais alguns anos, segundo o presidente do grupo.

Entre agosto de 2020 e abril de 2021, foram destinados cerca de R$ 35 milhões para a criação da companhia aérea, segundo a administradora judicial. O presidente anunciou que iria receber aporte de US$ 500 milhões de um fundo dos Emirados Árabes Unidos, mas até hoje não confirmou se esse aporte se concretizou, sob a alegação de que os termos são confidenciais.

Itapemirim já teve aérea de carga

Na década de 1990, a Itapemirim teve uma companhia aérea própria, que deixou de existir no início dos anos 2000. Operava prioritariamente aviões de carga, setor que já explorava na modalidade rodoviária. Passageiros eram transportados em aviões Cessna Grand Caravan, com capacidade máxima de nove lugares.

Em 2017, a Itapemirim anunciou a compra da Passaredo, que passava por um processo de recuperação há anos. Em agosto daquele ano, porém, a Justiça decretou o fim da recuperação judicial da Passaredo, e a empresa voltou atrás na negociação com a Itapemirim.

Segundo a aérea, a companhia de transporte rodoviário descumpriu condições estabelecidas em contrato, o que teria feito o negócio não evoluir.

* O repórter viajou a convite da Itapemirim Transportes Aéreos.