Bolsonaro surpreende e mostra que está aprendendo a falar
Só fazemos melhor aquilo que repetidamente insistimos em melhorar. A busca da excelência não deve ser um objetivo, e sim um hábito.
Aristóteles
Os ares da Ásia e do Oriente Médio parece que fizeram bem aos discursos do presidente Jair Bolsonaro. Ele, que tem apresentado na comunicação uma de suas maiores deficiências, na viagem de 12 dias aos países dessas regiões, acertou o tom e a forma para falar em público. Não nos lembra aquele orador titubeante e inseguro de outras apresentações.
Tive a oportunidade de fazer inúmeras críticas à maneira como o presidente Jair Bolsonaro se expressava em público. O objetivo sempre foi o de aproveitar o exemplo de seus acertos, erros e defeitos para fazer uma reflexão e avaliar se nós também não estávamos apresentando as mesmas virtudes, ou cometendo os mesmos equívocos quando nos apresentamos diante da plateia.
Comentei sobre a sua linguagem inadequada empregada muitas vezes no exercício da Presidência da República. O uso do palavrão e da gíria, que chega a ser condenado até nas conversas do dia a dia, quando não há intimidade suficiente para essa fala mais despoliciada, torna-se mais grave, muito mais grave ainda nas situações em que a liturgia do cargo exige compostura.
Além do linguajar, os maiores problemas apresentados por Bolsonaro em seus discursos estavam na maneira artificial como se posicionava diante da plateia, especialmente quando lançava mão do teleprompter. No pronunciamento oficial que fez em rede nacional na época das queimadas na Amazônia foi um verdadeiro desastre.
O presidente falou com postura rígida, mantendo os olhos vidrados, truncando frases, sem nenhuma expressão corporal. E, por causa de sua insegurança, se apoiava ora sobre a perna esquerda ora sobre a direita, em demonstração evidente de desconforto. Cheguei a dizer que ele parecia uma criança aprendendo a ler.
Começou a melhorar na ONU
Ao se apresentar na ONU, Bolsonaro evoluiu. As frases já não estavam mais truncadas e usou o teleprompter com mais competência. O seu discurso foi firme, incisivo, mas não agressivo. Foi, sem dúvida, o melhor discurso de Bolsonaro até aquele momento. Alguns ficaram indignados com o fato de eu ter dito que foi o seu melhor discurso, mas não conseguiram me mostrar outra apresentação dele que fosse superior em qualidade.
Se observarmos os discursos de Bolsonaro desde a sua posse, vamos constatar que ele tem melhorado muito. Na visita que faz ao Japão, China e Oriente Médio, houve um crescimento impressionante na qualidade de suas apresentações. Mesmo repetindo chavões e se valendo de frases feitas, suas exposições são cada vez melhores.
No discurso (veja vídeo no alto da página) que fez em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, nesse domingo (27), para uma plateia de cerca de 500 empresários, investidores e homens de negócio, Bolsonaro se superou. Foi uma demonstração de que com empenho, disciplina e boa vontade qualquer pessoa consegue aprimorar a comunicação. O presidente fez uso de um conjunto de recursos que, quando bem aplicados, podem dar excelente resultado.
Bolsonaro mostrou domínio dos recursos de comunicação
Os organizadores do evento agiram de maneira correta, deixando o teleprompter a uma distância adequada e na linha da comunicação visual de Bolsonaro com o público. Pode dar a impressão de que olhava o tempo todo para a plateia, sem nenhum tipo de esforço.
Tanto assim que algumas pessoas ficaram surpresas quando souberam que ele usou o aparelho. Como as transmissões feitas pela TV e pela internet mostraram as imagens fechadas no presidente, parecia que ele se comunicava de improviso. Só foi possível notar o teleprompter nas raras oportunidades em que a câmera fez tomadas mais abertas.
Ele leu o discurso impresso no papel, no teleprompter e arriscou falar de improviso algumas frases que tem utilizado com frequência em suas apresentações. Entre uma frase e outra, teve a tranquilidade de fazer pausas e manter os olhos nos ouvintes. Com essa atitude, valorizou as informações transmitidas e deu oportunidade de reflexão ao público.
Chamo a atenção para esse aspecto porque nas apresentações anteriores, quando Bolsonaro arriscava olhar para o público, o que ocorria raramente, voltava de maneira precipitada à leitura, provavelmente com receio de se perder. Esse retorno muito rápido era também um forte indicador de insegurança.
Para lançar mão de todos esses apoios e usar essas técnicas, ele deve ter ensaiado bastante, pois somente assim poderia se mostrar bem preparado. Quando alguém se vale de tantos recursos, qualquer contratempo pode comprometer seu desempenho. Alguns oradores, até com bastante experiência em fazer apresentações, se complicaram. Não sabiam bem a hora de ler no papel, no teleprompter, ou qual o momento de improvisar.
Dessa forma, ora Bolsonaro olhava para o discurso que estava sobre o pódio, ora lia o texto projetado no teleprompter, ora tirava os óculos e, sem ler, fazia comentários complementares a respeito de alguma informação que acabara de transmitir. Foi um bom resultado, principalmente para quem até outro dia não tinha intimidade com o teleprompter.
O presidente fez um discurso curto, objetivo, na medida certa. Tocou em todos os pontos relevantes para aquele tipo de plateia. Falou da taxa de juros, que é a mais baixa de que se tem notícia no Brasil. Destacou o fato de a inflação estar abaixo da meta. Ressaltou a queda do desemprego. E revelou que estamos nos livrando dos entraves que dificultam os negócios em nosso país.
Também não poderia ser mais oportuno fazer referência, como Bolsonaro efetivamente fez, ao fato de que o Brasil é "um país de todas as raças, de todas as religiões, que comporta gente do mundo todo e convive em perfeita harmonia". Por mais óbvias que essas informações possam ser para muitos de nós brasileiros, lá fora nem sempre esses dados positivos são divulgados.
Ainda precisa melhorar muito
Alguém poderia dizer que talvez fosse conveniente aprofundar aqui e ali certos pontos de sua mensagem, acrescentar uma ou outra informação, mas para uma plateia nem sempre tão familiarizada com as questões brasileiras, as informações foram bastante adequadas.
O resultado saberemos quando a comitiva presidencial passar a régua, fechar a conta e avaliar os frutos dessas negociações. Tudo indica que estão sendo muito positivos. Independentemente de governo, essa deve ser uma política de Estado —ampliar negócios com o maior número possível de países.
Ninguém poderá dizer que Bolsonaro já se transformou em exímio orador. Acho até que jamais chegará ao patamar dos grandes tribunos. Se, entretanto, continuar progredindo como está, cumprirá muito bem o seu papel. Tomara que ele e todos aqueles que falam em nome do Brasil possam se expressar com competência cada vez maior, pois, independentemente de posições ideológicas, quem ganha é o povo brasileiro.
Superdicas da semana:
- Ninguém é tão bom que não possa melhorar
- Ninguém é tão ruim que não possa aprender
- Não devemos desanimar nos primeiros insucessos
- A comunicação é uma arte que deve ser aprendida e aperfeiçoada sempre
- Quando ler, não se esqueça de olhar para os ouvintes
- Ao olhar, mantenha o contato visual depois de pronunciar a última palavra
- Não tenha pressa de voltar à leitura. Assim, demonstrará domínio e segurança
Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante; "Como falar de improviso e outras técnicas de apresentação", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva; e "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.
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