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Carlos Juliano Barros

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Golpismo vai além do terror com bloqueios, cartel e ameaça de greve

Manifestantes bloqueiam rodovia BR-163 no município de Lucas do Rio Verde (MT) - Drielkson Ribeiro
Manifestantes bloqueiam rodovia BR-163 no município de Lucas do Rio Verde (MT) Imagem: Drielkson Ribeiro

10/01/2023 04h00

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Para quem ainda achava exagero dizer que franjas extremistas do bolsonarismo tramavam um golpe de Estado, o 8 de janeiro serviu para dissipar quaisquer dúvidas.

Tratado como bravata por autoridades e formadores de opinião, o plano estava escancarado ao menos desde o 7 de setembro de 2021: provocar o caos para levar as Forças Armadas a tomar o controle do país.

Mas o quebra-quebra do domingo não deve ser encarado como um ato isolado cometido por membros delirantes de uma seita bolsonarista.

Há uma organização golpista que precisa ser mapeada, desmantelada e, principalmente, punida.

Até porque existem diversos indícios de que continua de pé a estratégia de desestabilizar o governo eleito com o objetivo de virar a mesa.

Cartel nos combustíveis, bloqueio nas estradas, greve geral

A recente alta dos preços dos combustíveis, apesar de não terem ocorrido oscilações importantes nas cotações internacionais e nos custos das refinarias, acendeu o alerta de que distribuidoras estariam montando um cartel para desgastar o novo mandato de Lula.

Inclusive, a Secretaria Nacional do Consumidor, órgão ligado ao Ministério da Justiça, já notificou oito entidades que representam postos de combustível em todo o país.

Além disso, desde o fim do segundo turno, uma série de bloqueios nas estradas vem ocorrendo em estados com forte identificação com o bolsonarismo, como Mato Grosso e Santa Catarina.

As ações sugerem que lideranças radicais do agronegócio, em conluio com transportadoras e caminhoneiros, atuam para asfixiar o abastecimento e gerar pânico na população —por sinal, uma tática usual em outros países latinoamericanos.

Por fim, a promessa de uma "greve geral", vendida por representantes da direita populista, também ajuda a manter os extremistas excitados.

Aliado fiel do ex-presidente Bolsonaro, o senador Magno Malta (PL-ES), por exemplo, gravou no mês passado um vídeo convocando conservadores a tomar uma "ação dura", sugerindo uma paralisação generalizada.

Com a repercussão negativa dos atos terroristas de domingo em Brasília, Malta voltou às redes para se eximir de qualquer responsabilidade e dizer que jamais havia fomentado a violência.

Risco de golpe é pequeno, mas estrago na economia pode ser grande

Curiosamente, uma organização golpista parece estar criando vida própria, sem a tutela do núcleo duro do bolsonarismo, comandado pela família do ex-presidente.

Em outras palavras, pode estar em curso um descolamento entre o topo e a base da extrema-direita brasileira.

Enquanto pôde, Bolsonaro se aproveitou das mensagens golpistas cifradas para manter sua base acesa e emplacar a reeleição —quase deu certo.

Mas, no fundo, o núcleo duro do bolsonarismo sempre soube que um golpe de Estado à moda antiga, com participação dos militares, dificilmente se concretizaria.

Tanto que, uma vez perdida a disputa democrática nas urnas, Bolsonaro se mandou para os Estados Unidos, de onde criticou timidamente, para dizer o mínimo, as cenas de terrorismo em Brasília.

O problema é que o capitão deixou para trás uma legião de extremistas dispostos a tomar o poder por conta própria, financiados por uma obscura rede de empresários que ainda precisa ser desvendada.

A boa notícia é que a chance de um golpe acontecer é nula. Porém, o estrago que a tensão política provoca não é nada desprezível.

Economia, como se sabe, é expectativa. Confiar e investir em um país em que o assunto principal é a ameaça de um golpe de Estado não parece ser a decisão mais segura.

Reconstruir o Brasil no pós-Bolsonaro deve levar mais tempo do que gostaríamos.