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Como a crise da Azul já está afetando os passageiros e o que pode piorar?

A companhia aérea Azul enfrenta uma série de problemas que podem impactar seus voos. A empresa, que já teve ações cotadas a R$ 62,41 antes da pandemia, encerrou o pregão desta quinta-feira (26) com seus papéis valendo R$ 5,61, uma queda de onze vezes em relação ao pico de 2020.

Sem balinhas

Snacks servidos a bordo de voos da Azul: Empresa limitou temporariamente a quantidade disponibilizada aos clientes
Snacks servidos a bordo de voos da Azul: Empresa limitou temporariamente a quantidade disponibilizada aos clientes Imagem: Divulgação/Azul

Nas últimas semanas, a Azul passou por uma reformulação em seu serviço de bordo. A medida, anunciada como temporária devido a problemas com fornecedores, não teve uma data definida para o fim.

Conhecida por oferecer lanches rápidos (os chamados snacks), a empresa costumava disponibilizar pacotes de torresminho, amendoim, goiabinha e balinhas de gelatina em formato de avião, entre outros, à vontade para os passageiros. Agora, de acordo com um comunicado interno ao qual o UOL teve acesso, esse serviço não está mais disponível em voos com menos de 45 minutos de duração.

Nessas rotas curtas, será oferecida apenas água aos passageiros. Nos voos domésticos, os pacotes estão limitados a um por cliente, com a possibilidade de escolher entre suco, refrigerante e água à vontade. Em algumas rotas, o café ainda será oferecido.

Além disso, a empresa estuda implementar um serviço de bordo pago, com o objetivo de aumentar as receitas auxiliares — aquelas provenientes de serviços fora do preço da passagem, como despacho de bagagem e marcação de assento.

Por essa razão, é pouco provável que os snacks voltem aos voos, ao menos, como antigamente, quando eram disponibilizados à vontade.

Rotas de ônibus canceladas

Foto histórica da primeira linha de ônibus da Azul ligando o aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP) à capital paulista
Foto histórica da primeira linha de ônibus da Azul ligando o aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP) à capital paulista Imagem: Divulgação/Azul
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Devido à distância e à baixa conectividade com o Aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), principal hub da companhia, a Azul oferecia diversas rotas de ônibus para seus clientes. No entanto, essas rotas foram drasticamente reduzidas.

Antes, era possível pegar um ônibus saindo do Shopping Eldorado, em São Paulo, de Tamboré ou do terminal rodoviário da Barra Funda com destino a Viracopos, com horários variados de acordo com a demanda. Desde agosto, a única rota remanescente liga o Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, a Viracopos, com sete frequências diárias em cada sentido, sendo que apenas dois horários oferecem ônibus acessíveis para pessoas com deficiência.

Crise pode afetar rotas

Avião Cessna Grand Caravan 208 da Azul Conecta, para até nove passageiros
Avião Cessna Grand Caravan 208 da Azul Conecta, para até nove passageiros Imagem: Divulgação

O prolongamento da crise da Azul pode levá-la a descontinuar rotas menos lucrativas e ajustar sua malha de voos, mesmo que não tenha cogitado uma recuperação judicial, hipótese já descartada pela empresa.

Rotas consideradas premium, como a ponte aérea Rio-São Paulo e as conexões com Brasília, dificilmente seriam afetadas. No entanto, rotas de menor ocupação e menos rentáveis podem passar por alterações.

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Situação insustentável

Nas últimas semanas, a Azul tem anunciado diversas iniciativas, como uma parceria com a fabricante de carros elétricos BYD para um serviço de concierge em aeroportos e a chegada de uma nova aeronave da Embraer e outro Airbus A330 para rotas de longa distância. Ao mesmo tempo, a empresa anunciou novas rotas, incluindo voos internacionais.

No início do mês, o CEO da empresa, John Rodgerson, gravou um vídeo explicando a situação da Azul e a estratégia adotada para tentar tranquilizar os colaboradores. Na mensagem interna, ele afirmou estar agindo de maneira proativa nas negociações com credores, frisando que isso faz parte do negócio.

No dia 24 de setembro, a agência de classificação de risco Fitch rebaixou a nota da Azul para CCC (anteriormente B-). A situação da empresa teria se tornado "insustentável" (leia na coluna de Graciliano Rocha).

Na sexta-feira (20), outra agência de classificação, a Moody's, também rebaixou a nota da Azul de Caa1 para Caa2. Cada agência possui um sistema próprio para avaliar os riscos das empresas, o que explica a diferença na nomenclatura.

Grande parte das dificuldades enfrentadas pela empresa está relacionada ao enfraquecimento do real frente ao dólar. O setor aéreo é fortemente atrelado à moeda americana, uma vez que custos como leasing de aeronaves, lubrificantes e combustível representam mais da metade do preço de uma passagem.

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Muitas das dívidas da Azul foram contraídas quando o dólar estava em um patamar bem inferior ao atual, o que agrava o balanço financeiro em um cenário de alta prolongada da moeda. Apenas entre abril e junho, a valorização do dólar fez as dívidas da empresa aumentarem em R$ 3,7 bilhões.

Outros fatores que influenciaram a situação da empresa foram a alta do querosene de aviação, que subiu fortemente durante a pandemia, mas que vem caindo nos últimos meses. Ao mesmo tempo, as enchentes no Rio Grande do Sul afetaram uma fatia de 10% da malha aérea nacional da empresa, com a indisponibilidade do aeroporto Salgado Filho.

Perspectiva de melhora

A empresa está renegociando atualmente uma dívida de cerca de US$ 600 milhões que vencem em 2025, 2026 e 2027. Essa dívida é composta, principalmente, com o leasing (uma espécie de aluguel) aos arrendadores das aeronaves.

Essa negociação estaria em estágio avançado, e deve ser anunciada até outubro. Os arrendadores passariam a deter cerca de 20% do capital da empresa com a negociação.

Após essa etapa envolvendo o leasing, a Azul quer levantar até US$ 400 milhões com seus credores financeiros. Como garantia, a aérea oferece a Azul Cargo, sua empresa de logística, que tem parceria com a Amazon para entregas pelo país.

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A liberação de cerca de R$ 5 bilhões em créditos do Fnac (Fundo Nacional de Aviação Civil) também pode dar um fôlego para a companhia.

Ao mesmo tempo, a Azul cobra na Europa uma dívida de cerca R$ 1 bilhão que a aérea portuguesa TAP lhe deve após um processo de reestatização que está sendo revisto. Caso não pague, a privatização da companhia pode ficar prejudicada, o que é considerado uma vantagem para o pagamento à empresa brasileira.

Duopólio ameaçado?

Uma possível fusão entre a Azul e a Gol também está sendo cogitada. Seria um momento oportuno, tendo em vista o processo de recuperação judicial iniciado pela Gol no começo do ano nos Estados Unidos, chamado de Chapter 11.

Essa possibilidade ganhou força após o anúncio de um acordo de codeshare entre as duas empresas, interpretado como um teste para uma futura fusão. A Azul mantém conversas com a Abra, holding que abrange a Gol e a colombiana Avianca, para uma possível fusão entre as empresas.

O UOL procurou a Azul, que ainda não se manifestou sobre os pontos questionados pela reportagem. O espaço segue aberto.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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