Dólar pode testar nível acima de R$ 4,50 e ficar ali, dizem analistas
Resumo da notícia
- Coronavírus, no mundo, juros baixos e governo, no Brasil, podem levar dólar a bater R$ 4,50, dizem profissionais de mercado
- No lado externo, covid-19 enfraquece economia global e isso reduz fluxo de dólares para Brasil
- No cenário local, atritos de governo Bolsonaro com Congresso geram incertezas e afastam investidor estrangeiro
O dólar vai voltar a testar o limite dos R$ 4,50 e pode até se estabilizar nesse patamar, dizem profissionais de mercado. Isso vai depender de três fatores que devem ser monitorados em março: se o coronavírus continua se alastrando em ritmo acelerado, se o Banco Central mantém a atuação discreta no mercado e se o presidente Jair Bolsonaro e comandados continuam a ciranda de agressões ao Congresso que atrapalhem o andamento das reformas.
Para economistas e gestores de recursos, a alta do dólar em relação ao real é provocada por fatores internacionais e domésticos. No exterior, o coronavírus enfraquece a economia mundial, reduzindo a atividade na segunda maior economia do planeta, a chinesa, e gerando reflexos globais sobre o comércio, o turismo e os investimentos. No Brasil, esse problema é amplificado pelos novos choques entre Jair Bolsonaro e o Congresso, que multiplicam as dúvidas de investidores locais e estrangeiros sobre a capacidade que esse governo tem para entregar as reformas administrativa e tributária que o próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, considera fundamentais para o país retomar o desenvolvimento.
"O dólar vai continuar pressionado se o coronavírus seguir se alastrando sem controle porque isso aumenta as incertezas em todo o mundo, levando a uma maior procura por segurança no dólar, que se valoriza em relação a todas as moedas no mundo, não apenas em relação ao real. Mas para piorar a situação no Brasil, aqui temos a incerteza com relação às reformas. Tem toda a celeuma que quase todo o dia envolve o presidente", disse o economista-chefe do banco digital Modalmais, Alvaro Bandeira.
Dólar acima de R$ 4,50
O responsável pela mesa institucional de futuros da Genial Investimentos, Roberto Motta, destaca que o mercado ainda não achou um ponto de equilíbrio para o dólar na nova realidade brasileira de juros baixos, com a Selic em patamares mínimos históricos. "Por enquanto, o que posso dizer é que o mercado já interpretou que o dólar acima de R$ 4,30 não incomoda nem o Banco Central nem o ministro da Economia", afirmou.
"O governo brasileiro se posiciona de maneira favorável ao cenário de juros baixos e câmbio alto, o que indica que não serão frequentes as intervenções do Banco Central com o objetivo de conter os avanços do dólar", afirma o sócio da plataforma de cotação de moedas Melhor Câmbio, Felipe Tayer, lembrando que por mais de uma vez o ministro da Economia, Paulo Guedes, deu declarações destacando que o Brasil vive agora uma nova realidade, de juros baixos e dólar apreciado.
A estratégia do governo com esse modelo, dizem analistas, seria estimular investimentos locais e estrangeiros na economia real e favorecer os exportadores para aumentar as vendas de produtos brasileiros no mundo.
Mas por enquanto, os juros baixos no Brasil só tiveram um efeito - o de afastar aquele estrangeiro que vinha para o Brasil para aplicar no mercado financeiro, o chamado capital especulativo. Esse é um dos fatores que levaram o dólar a entrar em ciclo de alta desde meados de 2019.
Em 2020, o coronavírus só amplificou esse ciclo que já estava presente no Brasil em 2019. Agora, como as empresas e investidores pelo mundo estão ainda mais incertos sobre o ritmo da economia global em meio ao surto do covid-19, cresce a procura por ativos considerados mais seguros, como dólar, títulos do governo americano e ouro.
Nesse quadro, diz Roberto Motta, da Genial Investimentos, a questão é: "quem é vendedor de dólar hoje?". Segundo ele, quem tem moeda americana prefere segurar para ver até aonde vai a valorização; e quem não a tem está procurando pegar um pouco das verdinhas.
O gerente de trade do Travelex Bank, Felipe Pellegrini, disse que o mercado deve testar se o dólar pode ficar de forma mais estável oscilando entre R$ 4,40 e 4,50. "Abaixo de R$ 4,40 só se tivermos muitas boas notícias", afirmou o executivo da casa financeira especializada em câmbio para empresas e pessoas físicas.
"Mesmo que o dólar recue, não vejo mais a moeda americana voltando abaixo de R$ 4,00", afirma a economista-chefe da gestora de recursos Azimut Brasil, Helena Veronesi.
Governo brasileiro também não ajuda
Segundo Helena Veronese, além do coronavírus, ruídos criados pelo governo Bolsonaro também formaram um ambiente favorável a uma maior procura pelo dólar no Brasil este mês. "Mesmo que não fosse o coronavírus, essa semana já não seria boa para o real por causa dessa aparente piora das relações entre o presidente e o Congresso", disse a economista.
O fluxo de investimentos de longo prazo voltados para a atividade econômica só ganhará força para o Brasil quando o país der sinais mais claros e sustentáveis de que retomou o caminho do crescimento e do grau de investimento. E isso passa pela aprovação de reformas e pela estabilidade política, dizem economistas e gestores de recursos.
Mas essa trajetória se torna mais complicada quando, por exemplo, o presidente da República integra convocações para atos contra o poder Legislativo ou faz comentários acerca de qual impacto teria uma bomba lançada sobre o parlamento.
Seja porque o PIB continua patinando, seja porque crescem os questionamentos sobre a capacidade de o governo Bolsonaro levar adiante as reformas que prometeu, tudo significa menos dólares entrando. "Falta fluxo de dólares para ajudar o real", afirma o diretor de estratégia da Meu Câmbio, Mathias Fischer.
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