O que Harry, Maia, Bolsonaro e Moro têm a ver com a sua comunicação?
A atenção é a mais importante de todas as faculdades para o desenvolvimento da inteligência humana
Charles Darwin
Desmoronou um prédio. Quando? Onde? Se tivesse desmoronado nos anos 1920 na Malásia, os ouvintes que vivem aqui hoje teriam baixo interesse por essa informação. Se, entretanto, o mesmo fato tivesse ocorrido no início deste ano, em um país próximo das nossas fronteiras, essa notícia já chamaria um pouco mais de atenção de quem recebesse a mensagem nos nossos dias. Por outro lado, se esse desmoronamento acontecesse hoje na cidade onde vivemos, a atenção das pessoas para o fato seria muito mais elevada.
Há um conceito bastante simples, mas muito importante no processo de comunicação: de maneira geral, quanto mais um assunto estiver próximo no tempo e no espaço, maior será o interesse do ouvinte. Ao contrário, quanto mais o tema se distanciar no tempo e no espaço, menos interessante será para quem ouve. Estou me referindo a "ouvinte" aqui só como facilidade didática, mas poderá ser aplicado também para quem "lê". Ou seja, o que vamos analisar servirá tanto na comunicação oral quanto na escrita.
Adapte o assunto à realidade dos ouvintes
Ao falar com as pessoas, seja em uma reunião, seja em uma palestra, seja até em uma simples conversa informal, procure formular a você mesmo a seguinte pergunta: "Que tipo de adaptação eu devo fazer na minha narrativa para que este tema vá ao encontro da realidade e do interesse dos ouvintes?"
Quando conseguimos inserir o assunto no mundo vivenciado por aqueles com os quais nos comunicamos, ampliamos as chances de cativarmos sua atenção.
Por isso, sempre que possível, devemos associar a mensagem que desejamos transmitir a fatos que cercam os ouvintes. Citar como exemplo acontecimentos que estejam ao seu redor ou nas manchetes dos jornais, que envolvam personalidades atuais destacadas pela atuação, como políticos, artistas, empresários, esportistas e religiosos, instiga o ouvinte a acompanhar as informações com mais envolvimento.
O risco a ser evitado
Embora esse recurso de comunicação seja excepcional por causa dos resultados que pode proporcionar, saiba, porém, que haverá sempre o risco de que as pessoas que recebem a mensagem não entendam que, ao citar uma personalidade, você esteja apenas se valendo de um exemplo para tornar a informação mais concreta, didática e interessante.
Alguns nem chegam a prestar atenção na mensagem principal, pois são, às vezes, tão fascinados pela personalidade mencionada que entendem ser ela o objetivo principal da informação. E, se tiverem possibilidade de interagir com comentários, irão criticá-lo ou elogiá-lo, porque se referiu àquela figura com sarcasmo, ironia, demérito ou enaltecimento equivocado.
Vejo aqui pelos textos que publico ao longo desses últimos 12 anos. Se eu tentasse explicar apenas a importância técnica da dicção, da postura, da gesticulação, do vocabulário, da estratégia de argumentação ou refutação, provavelmente me tornaria enfadonho e desinteressante. Os leitores só acompanhariam a matéria se tivessem mesmo muito interesse pelo aprendizado desses conceitos. Afora esses, talvez, nem passassem do primeiro parágrafo do artigo.
Os exemplos estão à nossa volta
Por isso, aproveito o fato de alguém como o ministro Sergio Moro pronunciar mal determinadas palavras para discutir as questões relacionadas à dicção. A partir do exemplo de uma personalidade dessa envergadura, é possível analisar as consequências de uma dicção defeituosa, se chega ou não a prejudicar a imagem e a credibilidade de quem suprime um ou outro som ou come algumas sílabas das palavras, como aconteceu no dia em que disse "conge", em vez de "cônjuge".
O nome do ministro entra na história como chamariz, pois o seu exemplo se transforma em ótima oportunidade para sabermos que pessoas de destaque no mundo político, social e empresarial também estão sujeitas a deslizes. E, a partir do seu exemplo, podemos refletir também como certos conceitos de comunicação precisam ser levados em conta no nosso dia a dia, especialmente quando nos comunicamos como profissionais.
Se você observar os comentários dos leitores nessa ocasião, vai constatar que a maioria só teve olhos para a figura do ministro, ou para me criticar ou elogiar porque falei mal dele, ou para me criticar ou elogiar porque o enalteci. Um ou outro conseguiu se distanciar de suas preferências políticas para dizer que aqueles ensinamentos técnicos foram úteis para sua vida dentro ou fora do mundo corporativo.
Da mesma maneira, quando analisei a estratégia de comunicação do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e a do presidente Jair Bolsonaro. Eu poderia tratar de argumentação e refutação sem mencionar os dois, mas é evidente que, a partir da citação de exemplos de figuras destacadas como essas que foram mencionadas, a informação se tornou mais atraente, e o ensinamento, mais fácil de ser assimilado.
Mais curiosa ainda foi a reação ao texto em que falei do príncipe Harry quando anunciou o nascimento de seu filho. Nesse dia ele estava visivelmente desconfortável, esfregando as mãos, voltando de forma precipitada à posição de apoio com os gestos e falando com voz sumida. Foi uma ótima chance para tratar desses temas. Assim que o artigo foi publicado, recebi inúmeras mensagens de leitores indignados porque critiquei o príncipe.
Só um ou outro percebeu conscientemente que eu estava usando o exemplo do príncipe como artifício para abordar aqueles temas tão relevantes da comunicação. Se ele se apresenta ou não sempre falando desse jeito não importa, pois o episódio em si é que foi importante para analisar como uma pessoa é vista quando se expressa com esse comportamento.
O que importa é o resultado
A referência aos nomes dessas personalidades é uma estratégia para despertar o interesse nos leitores, pois, ainda que só se dediquem a analisar aqueles que foram tomados como exemplo, sem que se deem conta, estão também assimilando e aprendendo os aspectos técnicos da comunicação. No fundo, é isso o que importa, pois o objetivo foi atingido, mesmo que por caminhos tortuosos.
Esse, portanto, deve ser o seu pensamento. Ainda que discutam a simpatia ou antipatia que nutrem com relação à pessoa tomada como exemplo, se entenderem e se interessarem mais pelo projeto ou proposta que esteja sendo apresentada, sua finalidade foi alcançada.
Apenas tome o cuidado em reuniões corporativas e circunstâncias semelhantes de não dar como exemplo pessoas que sejam excessivamente polêmicas a ponto de ofuscarem as ideias que esteja expondo. Por isso, dê preferência sempre a fatos ou pessoas que possam despertar interesse, mas que sejam também admiradas e respeitadas pela maioria. Dessa forma, ao associar ou transportar a mensagem para a realidade dos ouvintes, fará com que prestem mais atenção e se interessem por sua apresentação.
Superdicas da semana:
- Para tornar sua mensagem mais interessante, transporte o assunto para a realidade dos ouvintes
- Se você citar exemplos de pessoas conhecidas, os ouvintes poderão se interessar mais pela mensagem
- Cuidado para não citar como exemplo pessoas que sejam muito polêmicas
- Se puder, cite pessoas que sejam admiradas e respeitadas pelos ouvintes
Livros de minha autoria que ajudam a refletir sobre esse tema: "29 Minutos para Falar Bem em Público", publicado pela Editora Sextante; "As Melhores Decisões não Seguem a Maioria", "Oratória para advogados", "Assim é que se Fala", "Conquistar e Influenciar para se Dar Bem com as Pessoas" e "Como Falar Corretamente e sem Inibições", publicados pela Editora Saraiva; e "Oratória para líderes religiosos", publicado pela Editora Planeta.
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