Regra facilita troca de corretora onde você investe, mas elas burocratizam
Resumo da notícia
- Transferir aplicação de uma instituição financeira para outra pode ser feita sem saque de recursos
- Em tempos de coronavírus, portabilidade de investimento deve ser realizada de forma digital, diz CVM
- Exigência de assinatura autenticada em cartório para pedir portabilidade é condenada pela CVM
A volatilidade que tomou conta dos mercados desde o início da pandemia do coronavírus deixou muitos investidores angustiados e vários clientes insatisfeitos com o atendimento recebido na instituição financeira, levando a um aumento da busca pela portabilidade de investimento, ou seja, a transferência das aplicações de uma empresa para outra. É nessa hora que muitos descobrem que a facilidade que havia para abrir uma conta numa corretora, banco ou plataforma para investir vira dificuldade no momento de pedir a trocar do prestador do serviço.
Da mesma forma que um cliente pode pedir a portabilidade de uma linha de telefone entre operadoras ou de uma linha de crédito entre bancos, também é possível fazer a portabilidade de investimentos. Pelas regras, basta a pessoa abrir uma conta numa instituição financeira B, para onde pretender levar o dinheiro; depois, solicitar à instituição A, onde tem as aplicações, para fazer a transferência. O processo, que só pode ser feito para a mesma titularidade - ou seja, da pessoa para a mesma pessoa ou da empresa para a mesma empresa - deve ser realizado em até 48 horas, conforme recomendação da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
Mas a CVM começou a receber muitas reclamações de clientes insatisfeitos com corretoras, bancos e plataformas de investimento que estavam exigindo muita burocracia - desde o preenchimento de um formulário por escrito, assinatura em um documento e, para complicar, reconhecimento de firma em cartório por autenticidade. Nesses tempos de covid-19 e isolamento, enfrentar fila para colher carimbo da burocracia é tudo do que o ser humano não precisa.
Processo deve ser eletrônico, recomenda CVM
A Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários (SMI), da CVM, então soltou em 6 de abril um comunicado destacando que o requerimento de transferência deve ser, preferencialmente, realizado eletronicamente. E se, por algum motivo, tiver que haver algum procedimento por meio físico, a assinatura do cliente deve ser validada com a simples apresentação de documento de identificação válido. Portanto, não é necessário ir até um cartório para colher assinatura.
"É importante dizer que já não era considerado procedimento razoável a exigência de reconhecimento de firma para a solicitação de transferência de valores mobiliários ser considerada válida. Existem várias técnicas válidas e utilizadas pela indústria financeira para verificar a autenticidade de um pedido de transferência de posições de custódia, que podem e devem ser implementadas de modo consistente e passível de verificação", disse o superintendente da SMI, Francisco José Bastos Santos, no comunicado da CVM em 6 de abril.
Maior procura pela portabilidade
Para o planejador financeiro da Planejar, Roberto Agi, a justificativa dada por algumas instituições financeiras de que a assinatura reconhecida é necessária para evitar fraudes não faz muito sentido. "A portabilidade só pode ser feita para a mesma titularidade. Isso limita bastante a possibilidade de fraudes", afirma.
Profissionais de mercado dizem que a volatilidade dos mercados neste primeiro quadrimestre do ano de fato provocou um aumento da busca pela portabilidade do investimento. "Inquietude é normal em momentos de crise", afirma o co-CEO da Genial Investimentos Cláudio Pracownik
Dá para ser mais simples
O executivo da plataforma de investimentos 100% digital conta que alguns processos poderiam mesmo ser mais rápidos se não fosse pela burocracia ainda exigida por algumas instituições financeiras.
"A portabilidade é positiva para o mercado porque representa respeito ao consumidor e é meritocrática para as instituições financeiras". Segundo ele, a base de clientes da Genial cresceu 25% apenas em março, com destaque para uma migração de investidores vindos de bancos.
Também diz o superintendente comercial da Órama, Hugo Daniel Azevedo, que realizar a portabilidade em 48 horas e de forma eletrônica é plenamente possível, mas que algumas instituições financeiras tornam o processo mais travado.
Reconhecimento facial e nenhum documento físico
O UOL apurou que a portabilidade que costuma demorar é aquela solicitada junto a grandes bancos ou à maior plataforma de investimentos, a XP Investimentos.
O diretor jurídico da XP Investimentos, Fabrício Almeida, afirma que o processo seria mais ágil se fosse iniciado pela instituição financeira para a qual o cliente quer transferir o investimento, e não o oposto.
Segundo ele, a XP já deixou de exigir assinatura reconhecida em firma para realizar a portabilidade. "Nosso plano é, até o fim do ano, lançar o reconhecimento facial e fazer com que todo processo seja realizado sem envolver nenhum documento físico", afirmou.
"Tanto na entrada como na saída, queremos atender da melhor forma em termos de experiência", afirma o chefe de serviços financeiros e de investimentos do Itaú Unibanco, Carlos Augusto Salamonde, o primeiro grande banco que tem permitido aos clientes a portabilidade de custódia feita de forma totalmente digital e dentro dos prazos recomendados pela CVM
"Mas a gente depende da outra ponta, de onde está vindo, ou de para aonde está indo o recurso", diz.
Quando a portabilidade pode ser pedida
A portabilidade pode ser pedida para quase todos os ativos: ações; CDBs, Debentures; LCIs e LCAs; CRIs e CRAs e cotas de fundos imobiliários negociados em Bolsa.
Ou seja, se um cliente tem um lote de ações da Petrobras, por exemplo, que é movimentado por meio de uma conta no banco ou corretora A, ele pode transferir essas ações para o banco ou corretora B, sem que as ações tenham que ser vendidas ou negociadas. É como a linha de telefone: a pessoa continua com o mesmo número, só muda a operadora.
Segundo consultores financeiros, a portabilidade de investimento é uma ferramenta mais recomendada para aplicadores que estão mais insatisfeitos com o atendimento recebido nessa ou naquela instituição financeira do que necessariamente com os custos exigidos.
Não é só custo, mas atendimento também
"Depois que muitas tarifas foram zeradas, a principal questão hoje é o atendimento, canal de atendimento, acesso à plataforma tecnológica e serviços", afirma o sócio diretor da Solidus, Fernando Barbedo. Segundo o executivo da corretora, a portabilidade é importante para estimular a concorrência porque favorece o melhor serviço ao cliente.
O planejador financeiro da Planejar, Roberto Agi, diz que antes de pedir a portabilidade, o cliente precisa checar detalhes sobre o atendimento da instituição para a qual ele está migrando. "Não adianta olhar apenas o custo. Às vezes, o barato sai caro. É melhor pagar alguma taxa de serviço e ser atendido na hora do estresse do que não pagar nada e não conseguir ser atendido no momento da dificuldade", afirma.
Nem sempre há portabilidade
Em alguns casos, o cliente não pode pedir a portabilidade do ativo. Por exemplo, quando uma ação é usada como garantia de uma outra operação, como um contrato no mercado futuro.
Por isso, muitas vezes, a portabilidade pode demorar mais. "É preciso checar se o ativo não é parte de uma operação ou se há bloqueio judicial ou o ativo não está liquidado", afirma a gerente do departamento Jurídico da XP, Julia Duarte.
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