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Ex-detento fatura mais de R$ 1 milhão com cooperativa de reciclagem

Sergio

Do UOL, em São Paulo

22/10/2013 06h00

Depois de cumprir pena de seis anos no presídio da Papuda, em Brasília (DF), por assalto e roubo de carro, Fernando de Figueiredo, 44, foi em busca de uma oportunidade de trabalho, mas sem sucesso. Resolveu, então, abrir um negócio próprio junto com outros egressos do sistema prisional.

Hoje fatura mais de R$ 1 milhão por ano -entre R$ 120 mil e R$ 150 mil por mês- com a cooperativa de reciclagem de madeira Sonho de Liberdade, e gera uma renda mensal de R$ 1.000 a R$ 4.000 para os cooperados.

Segundo Figueiredo, o negócio surgiu porque um grupo de 10 colegas não conseguia trabalho. "O mercado, de modo geral, rejeita presidiários", diz.

Atividade começou com a produção de bolas

Por dominarem a técnica de fabricar bolas de futebol -prática que adquiriram no presídio-, montaram um negócio na área para vender de porta em porta.

Depois de dois anos de mercado, a concorrência chinesa arrasou o negócio -as vendas despencaram mais de 50%, passando de 500 unidades por mês para 250. Símbolo da empresa, a bola foi trocada, em 2007, pela reciclagem da madeira utilizada pela construção civil e depositada no aterro do Distrito Federal.

Figueiredo afirma que a cooperativa tem entre seus clientes duas indústrias do agronegócio: Cargill e Bunge. Desde o início, a estratégia de negócio foi buscar parceiros privados e públicos.

"Percebemos uma nova oportunidade de negócio, pois era uma montanha de madeira parada na nossa frente", diz Figueiredo.

Os cooperados afirmam que reciclam 1.500 toneladas por mês. Eles separam a madeira, que depois é triturada e vendida à indústria, onde vira combustível para as caldeiras.

Uma parte é trabalhada para confecção de móveis rústicos.

De acordo com Figueiredo, quando a cooperativa de reciclagem começou a dar resultado, os cooperados decidiram fazer uma parceria com a UNB (Universidade de Brasília), que criou uma linha de seis produtos.

A universidade fez o design dos móveis, e os preços variam de R$ 300 (poltrona) a R$ 1.300 (mesa de centro). Os produtos são vendidos sob encomenda para restaurantes, lojas e empresas.

Cooperativa já investiu R$ 450 mil em equipamentos

Para desenvolver o negócio, a cooperativa já investiu R$ 450 mil em equipamentos, desde um caminhão até serras e trituradores. "Consolidamos um projeto de inserção social, pois a cooperativa representa uma nova chance para detentos que, infelizmente, não conseguem entrar no mercado de trabalho", declara Figueiredo.

A Sonho de Liberdade surgiu na Cidade Estrutural, bairro de Brasília (DF), pois a maioria dos cooperados residia na região. A sede fica próxima a um aterro sanitário, o que facilita a coleta de material reciclável para a produção das peças da cooperativa.

Desde a fundação, segundo os líderes, as decisões são tomadas em assembleia.

Apesar de o carro-chefe da cooperativa atualmente ser a reciclagem, a produção de bolas, por exemplo, não foi descartada por ser uma marca da entidade.

Por mês são produzidas 300 bolas ao preço de R$ 35 (unidade), e a comercialização é só para eventos beneficentes e brindes corporativos.

Grupo recicla madeira do estádio Mané Garricha

Outra iniciativa da cooperativa foi uma parceria com o governo do Distrito Federal para reciclar a madeira do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, inaugurado na Copa das Confederações, e que receberá jogos da Copa do Mundo de 2014.

Convivência diária de associados é importante para o negócio

Para Davi Rogério de Moura Costa, coordenador do Observatório de Cooperativas da USP (Universidade de São Paulo), nas associações em que os cooperados não vivem próximos podem ocorrer problemas de esvaziamento e gestão por falta de convivência.

"Como os associados estão distantes, pois residem longe um dos outros, isso esvazia a ideia de uma associação de fato, e torna a cooperativa um negócio comum com os problemas que a gente conhece: falta de qualificação de mão de obra e atrasos na entrega de produtos", diz o coordenador.

Falta de gestão profissional é problema comum em cooperativas

O presidente do Sescoop-DF (Serviço Nacional de Aprendizagem de Cooperativismo do Distrito Federal), Roberto Marizi, diz que cooperativas de reciclagem enfrentam problemas de gestão, como desconhecimento de legislação trabalhista e tributária.

Segundo Marizi, o modelo de gestão dos cooperados é, muitas vezes, improvisado e torna as associações vulneráveis à fiscalização.

"O modelo de gestão de uma cooperativa é igual à gestão de uma microempresa, que exige profissionalismo, mas isso não ocorre em muitas cooperativas", diz o presidente do Sescoop.

50 mil detentos prestam serviço a empresas de São Paulo

Segundo a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, as empresas paulistas empregam cerca de 50 mil detentos. Eles recebem treinamento em 30 Centros de Qualificação Profissional e Produção, no interior das unidades penais.

Por mês são qualificados 1.500 sentenciados, com remuneração de R$ 508.

Eles produzem itens como móveis escolares e de escritório, que são comercializados para pessoas físicas e jurídicas e órgãos públicos, que podem adquirir bens e contratar serviços produzidos sem licitação.

Há também o Programa de Alocação de Mão de Obra que permite a contratação de detentos. Segundo a Funap (Fundação Professor Manoel Pedro Pimental), 562 empresas privadas e 55 do setor público estão no programa, totalizando cerca de 14,3 mil detentos.

As empresas interessadas nesse tipo de mão de obra podem obter mais informações na Funap (Fundação Professor Manoel Pedro Pimental), pelo telefone (11) 3150-1010.

Onde encontrar:

Cooperativa Sonho de Liberdade: